Somebody That I Used To Know

(Gotye)

Now and then I think of when we were together
Like when you said you felt so happy you could die
Told myself that you were right for me
But felt so lonely in your company
But that was love and it’s an ache I still remember

You can get addicted to a certain kind of sadness
Like resignation to the end, always the end
So, when we found that we could not make sense
Well, you said that we would still be friends
But I’ll admit that I was glad that it was over

But you didn’t have to cut me off
Make out like it never happened and that we were nothing
And I don’t even need your love
But you treat me like a stranger and that feels so rough
No, you didn’t have to stoop so low
Have your friends collect your records and then change your number
I guess that I don’t need that though
Now you’re just somebody that I used to know
Now you’re just somebody that I used to know
Now you’re just somebody that I used to know

Now and then I think of all the times you screwed me over
But had me believing it was always something that I’d done
But I don’t wanna live that way, reading into every word you say
You said that you could let it go
And I wouldn’t catch you hung up on somebody that you used to know

But you didn’t have to cut me off
Make out like it never happened and that we were nothing
And I don’t even need your love
But you treat me like a stranger and that feels so rough
No, you didn’t have to stoop so low
Have your friends collect your records and then change your number
I guess that I don’t need that though
Now you’re just somebody that I used to know

Somebody, I used to know
Somebody, now you’re just somebody that I used to know
Somebody, I used to know
Somebody, now you’re just somebody that I used to know

I used to know
That I used to know
I used to know

Lena

LENA

Lena, dirigido por Christophe Van Rompaey, conta a história de uma menina gorda e extremamente solitária, que inusitadamente começa a ter um relacionamento com Daan. Um rapaz bonito, popular e pouco confiável. Cansada dos tratamentos hostis da mãe (que, dentre outros “carinhos” a chama de hipopótamo e monstro), decide abandonar a casa e viver com o namorado. A mudança traz fortes questionamentos a Lena, que presencia diariamente a apatia do pai de Daan ( um homem com cerca de cinquenta anos, que depois da morte da mulher, deixou de se importar com o comportamento do filho que o apelidou de “fantasma”).

O filme me incomodou muito. Não pela história (que é interessante). O que me chamou a atenção foi o diálogo crú e o roteiro seco diante de assuntos tão complexos. Apesar de uma proposta diferente, o longa perde-se no marasmo e deixa o espectador um pouco entediado. Há também um outro detalhe importante: a protagonista causa uma incrível sensação de desconforto e pouca empatia. Ironicamente, apesar desses “contras”, a produção Holandesa/Belga (aliás, muito premiada) é um filme importante porque apresenta uma proposta diferente e trabalha  através do suspense psicológico com uma perspectiva sobre as amarguras da vida.

 LENA

Já no principio da trama, Lena (Emma Levie) aparece transando com um desconhecido que se envergonha de mostrá-la aos outros colegas. Essa é uma constante na vida da personagem que deixa muito claro o preço que se paga por “não ser como as outras” (ou seja, por ser gorda). Para enfatizar que esse é o seu grande ”karma”, vemos a garota se remoer ao observar o cotidiano da melhor amiga que sempre é buscada pelo namorado no trabalho. Pra piorar, quando chega em casa, depois do estágio, precisa ficar do lado de fora até que a mãe se despeça do namorado.

O papel masculino na vida da garota é um ponto relevante. O pai não mostra interesse, então Lena se vê nas mãos de uma mãe irresponsável e ardilosa. Os namorados da mãe são tão imprestáveis quanto ela. Os homens com que se relaciona só se interessam por sexo e se sentem envergonhados de exibi-la aos outros. Daan, o primeiro namorado e até então, o único homem que a valoriza é lindo e simpático, mas está envolvido com furtos e drogas. O pai de Daan é um lunático mal resolvido que a assedia.

Completamente absorvida por um mundo estereotipado, Lena tenta desafogar-se das pressões cotidianas nas aulas de dança que frequenta semanalmente. Há momentos belíssimos criado pelo diretor que usa muito bem a câmera panorâmica. Enquanto está tomada de tamanha tristeza ou de felicidade, a câmera possibilita que o espectador se torne um confidente (evidenciando o voyeurismo de quem está diante das telas).

Ficha Técnica:

Original: Lena (2011)

País: Bélgica, Holanda

Diretor: Christophe Van Rompaey

Roteirista: Mieke de Jong

Corpore insano

(por Thais dos Reis)

– Hoje, quando vinha pra cá, passei por três mulheres. Elas estavam encostadas na parede, se insinuando para os rapazes que andavam na calçada.

– E qual é o problema irmã?

– Elas diziam algumas palavras…

– Que palavras?

– Elas estavam gritando: “quer trepar?, quer trepar?”, acho que eram prostitutas.

– E o que te assusta nisso?

– Na verdade não me assusta, mas aquelas mulheres me chamaram atenção. Fiquei me imaginando no lugar delas.

– No lugar delas?

– Isso… se eu fosse uma prostituta.

-Então, o que você pensou?

-Não entendo porque elas se negam a beijar a boca dos clientes quando topam outras coisas… você sabe.

-Não, não sei irmã. Vamos! Diga! (disse a freira mais velha, quase implorando) Nos estamos sozinhas nesse quarto, as outras já se recolheram em seus aposentos.

– O que eu quero dizer é que elas não topam beijar na boca, mas topam coisas piores.

-Piores como?

-Como o sexo oral (disse a jovem, quase sussurrando)

– Acho que elas possuem uma ética profissional (respondeu a velha, com segurança)

– Ética profissional? (perguntou em gargalhadas)

-Bom, eu não sei… não faço ideia.

-Nos meus pensamentos… sabe, acho que ser uma freira é muito mais fácil do que ser prostituta.

-Como você chegou a essa conclusão irmã, se nunca foi prostituta?

-Me desculpe, me desculpe! (disse a jovem, segurando as mãos da companheira de quarto) Tento impedir pensamentos impuros que colocam as minhas virtudes em contestação, mas quando estou em contato com Deus, quando começo a orar sinto-me submersa em um prazer tão grandioso quanto um…

-Quanto um o quê irmã? Cuidado com o que vai falar!

– … quanto um orgasmo.

– Eu não consigo acreditar nessa comparação, são duas coisas completamente diferentes. E porque dizer que ser uma freira é mais fácil? Estamos sempre em castidade, abrimos mão da luxúria e da vaidade, estamos sempre em oração, trabalhamos para os pobres e menos favorecidos…

-Penso no cheiro.

-Cheiro? Que cheiro irmã?

– No cheiro dos homens.

(A freira mais velha, aproximou-se da jovem e colocou-a contra a parede. Aproximou-se tanto que poderia beijá-la,)

O que você está fazendo?

– Quero ter certeza que você é a minha companheira de quarto. Aquela que há alguns anos chegou no convento submergida em uma inocência e uma pureza, que não consigo enxergar mais.

– Não duvide de mim irmã. Na verdade, o que eu sinto por elas é compaixão. Tenho pena da vida que elas levam.

– Então não tenha, elas escolheram essa vida (disse, se afastando)

– Como pode dizer que escolheram essa vida? Elas foram levadas a fazê-lo. Provavelmente tiveram uma vida repleta de pobreza, sem oportunidades, não tiveram estudo!

– Nego-me a discutir com você sobre esse assunto. E tenho certeza que você também pensa assim. Está na hora de você rever seus pensamentos, antes que tenha a devida punição.

Depois veio o silêncio. Cada uma, deitada para seu lado, ficou pensando nas possíveis consequências daquela conversa única e inoportuna. Restavam dúvidas, restavam curiosidades. As duas poderiam ficar ali, conversando sobre aquele assunto durante dias . Mas por medo, por respeito (ou por qualquer outra coisa menos relevante), decidiram nunca mais falar sobre aquilo. Ironicamente, do outro lado da cidade, uma prostituta falava com a outra:

– Hoje vi uma freira na rua. Ela passou rapidamente, tentando esconder o interesse. Sabe, andei pensando… ser prostituta é muito mais fácil do que ser freira.

– Como? perguntou a outra, se você nunca foi freira?

Monstros

FREAKS

Na última sexta-feira tive a felicidade de assistir no Cine Humberto Mauro “Os Monstros”, dirigido por Tod Browning em 1932. Nutria uma curiosidade antiga pelo filme que conta a história de um circo em que as atrações principais são aberrações (daí o nome “Freaks”). Hans (interpretado por Harry Earles) é um anão que se apaixona pela trapezista mais bela do circo: Cleópatra. O anão tenta agradá-la de todas as maneiras, comprando presentes caros e se submete a terríveis humilhações. Cleópatra, por outro lado, é uma mulher gananciosa que só aceita se casar com Hans porque descobre que ele é herdeiro de uma grande fortuna. Mas assim como Hans, as outras aberrações do circo são honestos e leais. Percebendo as maldades de Cleópatra, se juntam e tramam uma vingança.

O filme ficou esquecido por muitos anos e foi censurado até a década de 60. Enquanto esteve em cartaz, causou repulsa e indignação dos espectadores e deu um prejuízo de 164 mil dólares a MGM. Mulheres grávidas foram proibidas de assisti-lo porque acreditavam que o filme poderia causar abortos. Algumas pessoas sofreram infarto durante a exibição, outras fizeram protestos para que parasse de ser transmitido. Todo esse rebuliço é muito curioso quando se pensa que as aberrações eram pessoas com alguma deficiência ou deformação física. A imagem de pessoas sem braços, sem pernas ou com algum problema de fala, não correspondia a estética americana e estavam muito distante do que hoje entendemos como politicamente correto. Aliás, o politicamente correto não existia

freaks

Os atores com deficiência, ou “as aberrações” também chocavam a equipe de produção e o elenco “normal”, que se sentiam incomodados por terem que atuar com pessoas que chamavam de retardadas. Não há muitas informações sobre os bastidores, mas o que se sabe e que Tod Browning enfrentou inúmeras dificuldades para sustentar as produções e manter a equipe em harmonia. O que se compreende hoje é que o filme foi de tamanha inovação e coragem inclusive porque o próprio cinema falado estava engatinhando

Os críticos classificaram o filme como uma produção sensacionalista e de mau gosto. Curiosamente, Browning trabalhou em um circo durante a sua juventude e presenciava diariamente as humilhações que os verdadeiros “freaks” sofriam. A grande ironia é na concepção de Browning,os monstros eram Cleópatra e seu amante Hércules, pessoas detestáveis e de caráter duvidoso. Depois que Cleópatra casa com Hans, ela se une ao amante para pensar em uma forma de matar o marido. O filme propõe uma reflexão de contraponto entre a moral e estética, aspectos fundamentais da sociedade pós-moderna.

freakskTomo a liberdade de reproduzir aqui uma parte do texto de Bernard Herzogenrath escrito no livro ‘1001 filmes para ver antes de morrer’ da editora Sextante: ‘Desde sua concepção original como um filme de terror que superasse todas as expectativas, algo mais perturbador do que qualquer coisa jamais vista (quando Dwain Esper o explorou sob titulos vagos e enganosos, como Amor proibido, Show de monstros e Erros da natureza), até seu renascimento como filme de vanguarda na tradição de Luis Buñuel e Alain Robbe-Grillet, Monstros, de Tod Browning, englobou os gêneros terror, filme de arte e documentário – este último, por conta de seu realismo, a partir do uso de ‘aberrações reais’. Não obstant, apesar da originalidade em termos de concepção e estética – e da surpreendente capacidade de ao mesmo tempo comover e chocar plateias – Monstros continua sendo, até hoje, uma obra subestimada. (…) Uma mera sinopse não pode fazer justiça a este filme assustador porém profundo, o qual é preciso de fato ver para ‘crer’. Uma suprema bizarra (aberração?) do cinema mundial, considerada por muitos o mais extraordinário filme da carreira de um diretor cuja filmografia inclui a versão original de Drácula (1931)”

Carmen Miranda

Carmen Miranda

Carmen é um dos símbolos mais interessantes de beleza e feminilidade que tenho em mente. Essa percepção veio a aumentar depois que terminei de ler uma de suas biografias, escrita por Ruy Castro. Pensei por algum tempo em que tipo de publicação faria hoje. Em principio queria citar (em referência ao dia das mulheres) algumas feministas que me inspiraram a conhecer e participar do movimento. Logo depois, pensei em filmes temáticos e músicas que seguem essa perspectiva e por fim, me lembrei da Carmen.

No dia que resolvi escrever sobre ela, conheci a jornalista Júnia, que por coincidência estava com o mesmo livro nas mãos. Foi um encontro completamente casual e inesperado e que me valeu muito. Eu passeava pelo edifício Maletta, estava com sede, entrei numa lanchonete e lá a encontrei. Eu disse para a Júnia que estava com a “Carmen na cabeça” e que não conseguia parar de pensar no triste fim que ela teve. Sabiamente, Júnia me disse que a vida é feita de escolhas e que Carmen foi uma mulher feliz com as escolhas que fez.

Carmen MirandaComo Helena Solberg diria em seu documentário “Banana is my business”, Carmen Miranda tinha a inocente ideia de que conseguiria representar o Brasil no exterior. Se comprometeu tanto que essa foi sua bandeira por muitos anos. Carmen exigia cantar em português em seus filmes e sempre estava na defensiva quando o assunto era o país. Se Carmen conseguiu representar o Brasil? Claro que sim, mas em partes. Ninguém jamais representaria um país em sua totalidade tendo em vista a complexidade e vastidão cultural, ideologia, política ou qualquer outro aspecto que engloba uma nação. Ainda assim, sua imagem está extremamente ligada ao Brasil, ela se tornou um símbolo.

Também por coincidência, o professor Mozahir citou o livro do Ruy Castro como uma bibliografia que ajudaria a entender o papel do rádio no país. Infelizmente, poucas pessoas (ou praticamente nenhuma) mostrou interesse por Carmen. Depois da aula tive que escutar: “quem é Carmen?” ou, “ela ainda está viva?“ Sim, Carmen continuará viva, enquanto for lembrada. Na verdade é um pouco decepcionante pensar que estudantes de jornalismo, já no fim do curso, não fazem ideia de quem foi Carmen. Não é uma informação que está colada na grade curricular, mas que eu tenho certeza: faria um bem danado! O Mozahir dizia: “foi incrível o que essa mulher fez”, ela chegou a ser uma das atrizes mais bem pagas de Hollywood na década de 1940, enfrentava maratonas diárias de shows e tinha uma repertorio invejável.

Sempre bem humorada e com consciência plena de sua beleza, Carmen ficou famosa ainda muito jovem. Comandava sua carreira com determinação e sabedoria. Pouco tempo depois de fazer sucesso cantando, comprou uma casa nova para os pais e aprendeu a dirigir. Tinha também muita habilidade com costura, por isso: customizava facilmente suas roupas. Aqueles sapatados gigantescos (e pesados) que usava nos shows foram inventados por ela e exigiam um equilíbrio fora do comum. Além disso, Carmen ditava moda. Chegavam a dizer que ela era careca porque nunca mostrava os cabelos. Os turbantes, na verdade, só se fixavam na cabeça justamente por causa dos cabelos. No fundo, ela achava toda aquela conversa de “ser careca” muito engraçada. Há também um fato interessante: antes de Hollywood, viajou muito pela América Latina. Chegaram a perguntar a Carmen se era verdade que o Brasil era uma “matagal” onde se encontrava macacos e cobras. Carmen brincava e dizia: “Sim, há muitas cobras”

Carmen Miranda

Apesar de todo esforço em representar o país, Carmen não foi bem acolhida pelos críticos brasileiros. Morando nos Estados Unidos, recebia em sua casa jornais ou informações de amigos da hostilidade dos críticos. Diziam que ela gesticulava demais, que tinha uma voz péssima, que estava gorda ou que tinha esquecido a língua portuguesa. Com tanta hostilidade, Carmen ficou temerosa de voltar ao Brasil. Quando veio pra cá, já em 1955, estava completamente confusa e fraca, resultado direto dos calmantes, dos estimulantes e da bebida.

Helena Solberg e Ruy Castro afirmaram inúmeras vezes sobre o quanto Carmen Miranda foi injustiçada. A obra deles, acima de tudo (e acima da própria Carmen) possui uma semelhança maravilhosa: todas as duas (tanto o livro, quanto o documentário) são de uma doçura incontestável, que fazem com que a gente se incline a gostar dela também. Um dos sonhos de Carmen era voltar ao Brasil e pular carnaval do meio da multidão. Dizia que queria se misturar no meio do povo, dançar até não poder mais e depois voltar para casa. Como Ruy Castro acrescentaria: esse era um devaneio, Carmen jamais conseguiria pular carnaval sem ser identificada.

Dois dos inumeros pares de sapato que Carmen Miranda colecionava em sua casa em Hollywood.
Dois dos inumeros pares de sapato que Carmen Miranda colecionava em sua casa em Hollywood.

De origem católica, sacrificou as próprias vontades em nome de um casamento em que a figura masculina dominava. Castro dizia no livro que em momentos de confusão (mental), Carmen chegou a afirmar que apanhava do marido (não se sabe se isso realmente aconteceu). David Sebastian conheceu Carmen nas filmagens do filme Copacabana. Ela aceitou as investidas e casou-se com o americano. * Antes, porém, Carmen teve inúmeras desilusões amorosas: hora por homens que não aceitavam sua fama e seu dinheiro, hora por homens que simplesmente não a levavam a sério. Ironicamente, o grande desejo de Carmen era se casar e ter filhos.

Como não acreditava em divórcio, perdeu parte da felicidade por um casamento desastroso. Ela, que vivia cercada de brasileiros em sua casa, teve que deixar de recebê -los. David também passou a empresariá-la, assegurando-se de sempre vê-la na ativa, não importasse o quanto estivesse exausta. Usou parte do dinheiro (que não era pouco) em investimentos sem futuro e em presentes caríssimos. Além disso, estimulou o uso das bebidas alcoólicas que no final da vida, tornaram-se um hábito, ou melhor: uma necessidade de Carmen.

Mas como Ruy Castro evidencia, David não foi o culpado pelo fim trágico de Carmen. Ele só veio a piorar as coisas. Com os limites da medicina na época, acreditava-se que tanto os calmantes quanto os estimulantes eram benéficos. Como uma bola de neve, Carmen foi aumentando as pílulas, até chegar nas medicações injetáveis. Para tentar diminuir o vício, os médicos cortavam as doses dos remédios, o que na verdade, deveria ser feito gradativamente. Assim, Carmen passava dias sem dormir, tinha alucinações, até o que o organismo cedia. Mas o ciclo vicioso dos remédios sempre voltava: e Carmen caiu em uma profunda depressão.

Carmen Miranda

Um dos tratamentos indicados e que Ruy Castro descreve era o choque elétrico. Ao que parece, Carmen recebeu cinco sessões de choques elétricos que comprometeram sua memória. Subia ao palco e submetia-se a apresentações em que muitas vezes esquecia as letras das musicas. Também já não tinha a mesma coordenação motora e constantemente perdia o ar ou ficava zonza.

“Em 1953, a aplicação dos eletrochoques ainda era feita em moldes primitivos. O paciente não era anestesiado. Não lhe davam um relaxante muscular e ele não recebia oxigenação artificial, como se passaria a fazer muito depois. Nem se sonhava com monitores cardíacos, cerebrais e de pressão arterial. E, pior ainda, não se fazia uma desintoxicação prévia, com a eliminação gradual dos medicamentos, que afinal, tinham levado àquela condição. Na época, a máquina de eletrochoque, fabricada pelos Laboratórios Lester, de Nova York, fornecia uma carga de 110 volts, muito mais do que, no futuro, se consideraria “aconselhável”. Eram precisos três enfermeiros para manobrá-la: um, para girar o botão e aplicar o choque, os outros dois, para conter o paciente e impedi-lo de se machucar e de, literalmente, levantar vôo.”

Os médicos alegaram que Carmen estava com problema nos nervos. A depressão estava tão profunda que ela não se levantava da cama, não comia nem falava. Veio ao Brasil pouco tempo antes de morrer. Tanto os médicos quanto os amigos próximos, acreditavam que essa era uma maneira de ajudá-la a melhorar. Carmen ficou hospedada no Copacabana Palace por mais de cem dias. Continuava tomando os remédios que um dia a matariam justamente para se manter nos palcos. Chegou a se apresentar no Brasil, foi recebida por milhares de pessoas que cantavam “Taí” em sua homenagem. Visivelmente fragilizada, confundia os companheiros da juventude que a visitavam no hotel e chorava sem parar. Castro dizia que ela cogitou a hipótese de não ir para Hollywood, mas o marido era insistente e praticamente a obrigara a voltar a ativa.

Carmen, fragilizada depois dos tratamentos.
Carmen, fragilizada depois dos tratamentos.

Em uma apresentação no programa de Jimmy Durante, Carmen cai de joelhos e diz que está sem fôlego (há, inclusive, diversos vídeos no Youtube, reproduzindo o show). Ruy Castro conta que nesse momento, ela revira os olhos e dá pra perceber que a morte já estava por perto. Naquela mesma noite, em 5 de Agosto de 1955, Carmen cantou seus sucessos para um grupo de amigos. Subiu ao quarto, fumou um cigarro, tirou a maquiagem e foi para o quarto. Faleceu após um colapso cardíaco. Foi encontrada deitada no chão segurando um espelho de rosto.

Seu corpo chegou ao Brasil em 12 de Agosto, cerca de quinhentas mil pessoas acompanharam o velório cantando “Taí” em despedida. As vendas dos seus discos aumentaram consideravelmente, semanas depois, já não tinham mais estoque. Carmen foi enterrada no Cemitério São João Batista.

*Carmen, no programa de Jimmy Durante: em uma apresentação que aconteceu hora antes de seu falecimento. Carmen, aos 24:07min cai e diz que está sem ar:

A morte de Lupe Vélez

lupe

Ontem na aula, o professor falava que a morte e a ironia andam de mãos dadas. Comentávamos do caso de conhecidos e de artistas que passaram por situações estranhas (ou inesperadas) antes da morte. Uma delas, um tanto esdrúxula foi Lupe Vélez.

Lupe Vélez (nome artístico de María Guadalupe Vélez de Villalobos) nasceu na cidade de San Luis Potosí no dia 18 de julho de 1908, no México. Há controvérsias sobre sua biografia. Para atender os parâmetros morais de Hollywood, dizia-se que Lupe passou a juventude em um convento e que sua mãe era uma cantora de ópera. A mãe de Lupe, na verdade, era uma prostituta que a vendia em programas noturnos. Ruy Castro chegou a classificá-la como a primeira “latina” de Hollywood. Ele explica que a também mexicana, Dolores del Rio chegou em Hollywood um pouco antes, mas que Dolores tinha um jeito aristocrático e por isso, os produtores a faziam passar por russa, espanhola ou francesa.

Lupe chegou em Hollywood em 1927, aos 19 anos. Como conta a lenda, diversos atores (como Clark Gable, Tom Mix e Charles Chaplin) cairam aos seus pés. Ela chegou a ficar três anos com Gary Cooper (mas o romance terminou quando tentou matá-lo a tiros – e errou os disparos). Dizem que Lupe trouxe o esteriótipo de latina temperamental. Há uma comentário de Ruy Castro sensacional sobre esse costume: “Também emocionalmente, tornou-se uma tradição de Hollywood mostrar as latinas como mulheres instáveis e infantis, sempre com um ombro de fora, sujeitas a arroubos fáceis de lidar (o comportamento adulto, maduro e racional seria privilégio das mulheres americanas). De tanto apresentá-las como tempestuosas e incendiarias, falando alto e muito rápido, Hollywood passou a acreditar que todas as latinas eram assim. E, de tanto serem apresentadas como tais, começaram a achar que eram mesmo daquele jeito”.

6TiYiyNurofbkpwcoTueQG70o1_400Pois bem, em dezembro de 1944 Lupe resolveu dar um fim a sua vida. A atriz estava na geladeira dos estúdios há muito tempo, encontrava-se completamente só e falida. Pra piorar, Lupe estava grávida de Harald Maresch, um homem casado. (Na época era quase impensável uma mulher solteira criar um filho sozinha). Lupe planejou uma morte glamurosa. Comprou inúmeras flores que distribuiu pela casa, colocou velas no quarto que davam um efeito na parede por causa dos espelhos. Pediu para jantar o melhor da comida mexicana, se maquiou e usou o vestido mais bonito. Antes, escreveu um bilhete para Harald onde dizia:”Para Harald. Que Deus o perdoe e perdoe a mim também, mas prefiro tirar minha vida e de nosso bebê do que trazer vergonha a ele ou matá-lo.”

Lupe tomou 75 comprimidos de Seconal (remédio para dormir) e se embebedou de uisque. Ruy Castro narra brilhantemente o que aconteceu: “Os 75 comprimidos de Seconal a puseram para dormir, sem dúvidas. Mas pouco depois ela acordou passando mal – como se o jantar, o conhaque e os barbitúricos quisessem explodir para fora do seu corpo. Lupe levantara-se e cambaleara vomitando pelo quarto, rumo ao banheiro. Já ali, escorregara no ladrilho, talvez no próprio vômito e mergulhada de cabeça em direção ao vaso. Ao bater com a cabeça, o choque a fizera perder os sentidos – e ela morreu afogada na água da privada.”

* Lupe deixou também uma carta para sua fiel secretária. E foi justamente a secretária que a encontrou morta. Durante anos, negou que Lupe tivesse morrido daquele jeito, dizia que Lupe foi encontrada na cama, cercada de flores.

* Andy Warhol realizou um filme em 1966 sobre a atriz