innocturne.

Compraram-lhe um cão. Disseram que era bom, que serviria de companhia e que ajudaria a superar a perda. Não tardou, o pobre bicho morreu de fome, abandonado a própria sorte. Ainda assim, ela se ajoelhava todos os dias antes de dormir, para implorar a Deus que lhe desse outra oportunidade. Cega de ódio planejou a própria morte, estouraria os miolos na frente de criancinhas do jardim de infância. Seria apenas o ponto de partida. Destroçada, sem nada que pudesse reviver aqueles sentimentos bons, sentou-se na cama pensando no que poderia fazer para torturar aqueles que não se compadeceram. “Uma hora, todo mundo te abandona”, pensou. Tomou o copo de leite, lembrou-se da mãe e mais uma vez, naquele dia que parecia infinito, chorou como um recém-nascido. Queria sair, comprar tinta preta. Não havia nada que a dava mais medo que o escuro. O medo lhe fazia sentir viva. Retomou ao quarto, colocou um pano sobre o espelho, fechou as portas e ligou o som. O violoncelo, mais que melancólico, anunciava um presságio: de morte ou de vida. Desejava as duas.