Abril Despedaçado

Abril-Despedaçado

Abril Despedaçado, filme dirigido por Walter Sales (importante diretor que traz no currículo filmes como Central do Brasil e Terra Estrangeira) é antes de tudo, uma obra que fortalece a identidade do cinema brasileiro e evidencia uma linguagem característica e bastante enraizada da nossa cultura: a do nordeste. Por isso é também importante dar a devida atenção ao roteiro de Karim Aïnouz (cineasta brasileiro que trabalhou em grandes obras como O céu de Sueli e Viajo porque preciso, volto porque te amo).

A partir de um cenário árido e cheio de simbolismo, acompanhamos a trajetória de Tonho (Rodrigo Santoro) que é atormentado por um questionamento: vingar ou não a morte do seu irmão mais velho, assassinado pela família rival. A luta teve início em décadas anteriores, quando o avô de Tonho, resolveu reivindicar os direitos pela terra que lhe foram tomadas pela família Ferreira. Desde então há um enfrentamento de várias gerações que por uma questão de honra, alimentam um ciclo de vingança e violência.

abril

Abril

A narrativa, baseada no romance do albanês Ismail kadaré, é ambientada no sertão nordestino de 1910 e consegue de forma sensível (e muito bela), tratar de temas cruéis que envolvem não só os valores humanos, mas também as relações sócias: uma delas, muito presente no filme: o patriarcado.  A figura masculina na obra possui um papel fundamental e está representada na ideia de força e seriedade que se concentra no pai. É ele o responsável pela continuidade das atividades produtivas que sustentam a família e é justamente ele, que alimenta (quase que de forma obrigatória) a vingança dos Breves.

abril-despedacado3A presença da morte na vida dos personagens é acentuada pela estagnação. Muito bem metaforizada na figura dos bois que ficam rondando na mesma direção e de maneira automatizada, sem sair do lugar. A bolandeira é a própria vida no sertão, onde não acontece nada e os personagens vivem a repetição das mesmas atividades, dos mesmos valores, do mesmo desejo de vingança e não saem do lugar. Mas essa rotina é quebrada pelo “menino” (Ravi Ramos Lacerda), irmão mais novo de Tonho e que narra todos os acontecimentos da trama. Apesar de se encontrar imerso nesse mundo paralisado, “menino” demonstra esperança, jovialidade e alimenta um questionamento sobre a necessidade de vingança.

Seu questionamento fica ainda mais forte com a chegada de Clara e Salustiano, um casal que está de passagem pelo local e que de alguma forma, trazem mudanças para a vida do personagem. Essas mudanças podem ser dividas em três etapas, igualmente importantes: 1ª) Clara presenteia o “menino” com um livro e alimenta sua imaginação quanto ao mundo e quanto ao mar. 2ª) “Menino” recebe um nome de Salustiano: Pacu, o que auxilia na criação da identidade do personagem, 3ª) Clara se envolve com Tonho e abandona o parceiro. Coincidentemente (ou não!) é nesse momento que os bois começam a se movimentar sozinhos na bolandeira (de tão automatizados) e Tonho se dá conta que alguma coisa precisa mudar (e inconscientemente, essa também é uma decisão de Pacu).