O harém de Madame Osmane

el-haren-de-madame-osmane-34014Fiquei surpresa com esse filme, do qual não conhecia a história e não fazia ideia de onde se passava. Fui assistí-lo por causa da Carmen Maura e tive uma feliz surpresa ao descobrir que se trata de uma produção franco-argelina, dirigida por Nadir Morkneche e produzida em 2000. Na trama, Carmen interpreta Madame Osmane, uma mulher mal-humorada que, após ser abandonada pelo marido, passa a comandar sua pensão com mãos de ferro para não perder o respeito. O ano é de 1993, acontece a Guerra Civil Argelina (um conflito armado entre o governo argelino e rebeldes islâmicos, iniciado dois anos antes. O número estimado de mortos foi de 200 mil pessoas).

Após ser lançado na França, o filme chegou a ser considerado um “Mulheres à beira de um ataque de Nervos” argelino. Não é para menos e não só pela fácil associação de Carmen à Almodóvar. Madame Osmane é uma mulher forte e cheia de problemas, a começar pela filha rebelde e respondona. Em sua volta está uma velha amiga confidente, o namorado de uma das inquilinas que vive a assediando, uma solteirona desesperada e uma moça, cujo marido é ausente. Enfim, Madame Osmane, assim como Pepa de Almodóvar, está prestes a ter um ataque de nervos.

Muitas coisas que vi no filme me soaram estranhas, é realmente um mundo que desconheço. A começar pelo ambiente, aparentemente seco e muito quente. As mulheres com todos aqueles panos, as cobrindo da cabeça aos pés (outras, com saias curtas), a rapidez dos diálogos, as roupas. Reparei que o universo de todas elas gira em função dos homens, é incrível como o casamento é fundamental para o equilíbrio emocional das personagens. A própria Madame Osmane, por exemplo, uma mulher forte (que chegou a ser militante pela independência da Argélia) é desmoralizada por não ter um marido ao seu lado.

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O mundo feminino, retratado no filme, me pareceu angustiante. Enquanto os homens saem para trabalhar e podem ter quantas esposas desejam, as mulheres não podem andar nas ruas sozinhas sem correr o risco de serem assediadas. Madame Osmane se destaca entre todas elas, exatamente porque é a matriarca da casa. Resolve os problemas, bate de frente com todos (inclusive com os homens) e ao mesmo tempo é extremamente infeliz. São muito interessantes as cenas que insinuam o quanto Madame Osmane é solitária e reprimida sexualmente, a ponto de antes de dormir, deitar-se no chão para escutar os vizinhos transando.

Em entrevista ao El País, Nadir Morkneche comentou que Madame Osmane “representa as vidas frustradas de tanta gente na Argélia, é também a representação das argelinas que romperam tabus na década de 70 e que, anos depois, encontram dificuldade para aceitar o mesmo sistema que as oprimiu quando jovens”. E ainda, sobre o universo feminino, observou que: “Existem dois tipos de educação na Argélia, uma para os homens e outra para as mulheres e é ela que configura as mentalidades. O homem da Argélia pode ser uma menino mimado por toda a vida, mimado por suas mães, irmãs e esposas.”

Por fim  é um filme que começa com um tom de humor e termina de uma maneira obscura e muito, muito triste.


 – ScreenCaps-