How to get away with murder

Uma pequena abordagem sobre como a série trabalha questões de gênero, sexualidade e raça

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A série chegou no final de sua segunda temporada e apresentou uma explosão de acontecimentos, com muito sangue derramado e um montão de gente saindo machucada (fisicamente e psicologicamente também). Sobre a trama, só consigo dizer que me encanta por tamanha genialidade e pela profundidade dos personagens. Fico chocada com o domínio técnico de quem criou essa história, que deve ter estudado arquétipos até não poder mais. Quer dizer, é gente que sabe o que faz e o faz muito bem. Para quem nunca assistiu, um singelo resumo: trata-se de uma série de suspense que retrata o cotidiano de uma professora de defesa criminal, Annalise e de seus alunos, que acidentalmente se envolveram em um assassinato. A série é transmitida pela ABC e produzida por Shonda Rhimes, a mesma criadora de Greys Anatomy.

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O elenco é encabeçado por Viola Davis, uma atriz com enorme carga dramática e muito talento. Sinceramente, é uma daquelas figuras cativantes que conseguem criar empatia com o público, mesmo interpretando uma mulher com sérios desvios morais. Na segunda temporada Annalise está mais obscura, sem rumo e desmoralizada. Em certo momento se referem à ela como um “cachorro morto” que insistem em chutar. Mas é incrível como, com sua inteligência e competência, consegue dar a volta por cima, surpreendendo e salvando a todos. É a perfeita anti-heroína.

Não dá para assistir uma série como essa e ficar indiferente ao fato da personagem principal se tratar de uma mulher, negra. [Annalise é uma mulher negra, linda, dona de seu próprio negócio, dominadora. Que fique claro.] Não vou me aprofundar na análise sobre questões raciais ou de gênero (até porque não tenho bagagem para falar disso) mas, sem dúvidas é um mérito da Shonda e nos faz questionar onde estão as protagonistas negras nas séries televisivas (novelas, programas de TV). Aliás, a questão me faz recordar o discurso de Viola no Emmy 2015: “A única coisa que diferencia as mulheres negras de qualquer outra pessoa é a oportunidade”.

MATT MCGORRY, KARLA SOUZA, AJA NAOMI KING, ALFRED ENOCH, JACK FALAHEE, VIOLA DAVIS, LIZA WEIL, BILLY BROWN, CHARLIE WEBER
Sobre as mulheres da série,  percebemos que todas são muito fortes. Desde Bonnie, a assistente de Annalise às alunas. Bonnie é o meu segundo personagem favorito, há nela muita dor e um mistério que ainda não foi bem desenvolvido. Pelo tom da segunda temporada, me parece que as humilhações a que ela se permite sofrer em relação à chefe estão ligadas muito mais a culpa do que a fraqueza ou gratidão.

Em suma são mulheres inteligentes, confiantes e estudadas que possuem o mesmo valor que os personagens masculinos. A imagem delas não é sexualizada, nem abordadas superficialmente  e muito menos reproduzem antigos arquétipos clichês. Sobre as alunas: Michaela também é uma mulher negra, de família endinheirada. Laurel é latina e também provém de uma família cuja situação financeira é boa (ela rompe com a dominação do pai e, desde o início da trama, deixa evidente que deseja trilhar o próprio caminho sem depender financeiramente dele).

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Outro ponto chave da série é o retrato respeitoso e com naturalidade sobre a opção sexual dos personagens. Um dos alunos, o Connor, é gay e não se explora a questão de forma pejorativa. Em seu contexto, ainda há o fato de que ele namora um homem portador do vírus HIV e, independente disso, vivem uma vida sexual ativa e feliz. Annalise é bissexual, e isso é esfregado na cara do espectador de forma surpreendente, porque em princípio, os fatos nos fazem acreditar que ela é heterossexual. Em entrevista, Shonda tocou no tema e ressaltou a importância de retratá-lo em suas séries: “Acredito que todo mundo deve começar a se ver refletido na TV. O casamento entre pessoas do mesmo sexo é a luta da nossa era, assim como foi a dos negros pelos seus direitos civis. Roteiristas como Norman Lear terem colocado negros na TV ajudou a mudar algumas mentes.”