Este filme ficou enterrado no meu computador por muitos anos, comecei a assistí-lo, mas a estética me provocou tamanha estranheza que deixei de lado. O “Ciclo Carmen Maura” me deu coragem para vê-lo e, com um pouco mais de persistência, completei o desafio. A verdade é que eu amei, amei, amei (o filme) e pirei ao ter conhecimento de vários aspectos da produção.
“Pepi, Lucy e Bom” marca a estreia de Almodóvar na direção, o filme foi lançado em 1980, custou meio milhão de pesetas e contou com a participação financeira e colaborativa de seus amigos, incluindo Carmen. Foi inspirado em uma fotonovela cujo título era “Erecciones Generales”, feita pelo próprio Almodóvar para uma revista underground. Nessa época, Carmen era muito próxima do diretor, os dois participavam de uma companhia teatral chamada Los Goliardos e até então, ele só tinha realizado pequenas gravações em formato 8 mm.
Fica muito claro que Almodóvar ainda não tinha uma marca própria, mesmo com um toque muito forte de contestação, da porra-louquice e das cores gritantes (o que vimos se repetir tantas vezes).
[Esse texto está cheio de spoiler, então… me desculpem] A trama conta a história de três amigas cujo comportamento é pouco comum. Pepi é uma jovem sustentada pelo pai e que é estuprada por um policial em seu próprio apartamento (ele iria prendê-la por encontrar várias plantas de maconha, mas ela oferece sexo em troca de liberdade. No entanto, revela que é virgem e pede que ele “vá por trás”, porque já está acostumada). Revoltada por ter sofrido tamanha violência, Pepi recorre à Bom e seus amigos punks para se vingar. Um dia encontram o policial na rua e o espancam (sem saber, que na verdade, o fizeram com seu irmão gêmeo). Pouco tempo depois conhecem e fazem amizade com Luci, a esposa do policial que tem certo comportamento masoquista (e que, posteriormente, se apaixona por Bom).
Mesmo sendo um pouco agressivo, o filme possui uma história extremamente feminina, quero dizer, há uma “alma feminina – feminista” que se percebe em vários detalhes e principalmente em Pepi, a personagem central. Depois que ela recebe o recado de que o pai não vai mais sustentá-la, Pepi começa a trabalhar em uma agência publicidade e criar peças voltadas para público feminino entre elas, uma calcinha que muda de cor durante a menstruação e se transforma em brinquedo sexual. Aos poucos Pepi vai deixando de ser uma menina dependente, e se torna uma mulher, livre.
Esse filme representa um pouco da busca pela liberdade (sexual) e o clima de descompromisso que Pedro e Carmen tanto comentam em suas entrevistas, também há o chocante (tratado como algo banal): como a cena em que Bom faz xixi no rosto de Luci ou a cena das Erecciones Generales, onde um grupo de amigos está reunido e elegem o maior pênis… o vencedor escolhe qualquer um da turma e define o que o escolhido precisa fazer para agradá-lo.
Em suma, um detalhe que passa despercebido, mas que é muito interessante é o fato de Bom ser uma jovem punk de 16 anos e Luci ser uma senhora, dona de casa, na faixa dos 40 anos. E isso é mencionado várias vezes durante o filme. Ainda que Luci não possua a aparência de uma senhora, há toda uma caracterização (como a peruca, as roupas e o próprio comportamento).
“Vemos neste filme vários atores que posteriormente voltaram a trabalhar com Almodóvar em papéis marcantes como Cecília Roth e Julieta Serrano .