Resenha: “O pintor da vida moderna”, Baudelaire

P.S – Nesta semana o professor solicitou esta leitura e eu fiz algumas anotações, que atrevo chamar de resenha. 

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Charles Baudelaire foi um poeta francês, considerado um dos percursores do Simbolismo e reconhecido como o fundador da tradição moderna em poesia. Nasceu em 1821 em Paris e faleceu em agosto de 1867. Uma de suas obras mais conhecidas é “Flores do Mal”, onde ele começa o seu projeto simbólico.  O livro “O pintor da vida moderna”, iniciado em 1863, foi escrito em três fases: a primeira para o Le Figaro (publicada em 26 de novembro) e a segunda publicada em 29 do mesmo mês. Mais tarde essas partes foram reunidas em uma coletânea num livro editado em 1868 sob o título de L’Art Romantique.

Através de um ensaio crítico, Baudelaire analisa a figura do pintor na vida moderna e suas relações com diversos setores, fatos e figuras que estão ligados à arte. Já no capítulo inicial o autor apresenta uma postura crítica em relação àqueles que supervalorizam as obras de arte clássicas e menosprezam os artistas menores. Como exemplo, cita as pessoas (a quem chama de amadores) que vão ao Museu do Louvre e se colocam radiantes diante de um quadro de Ticiano Vecellio e depois se dizem conhecedoras do museu. Ou mesmo aqueles que leram Rancine e Bossuet e acreditam que dominam a história da literatura.

Aprofundando suas reflexões, o autor ressalta a importância da moda e de sua contextualização para compreendermos o passado e o presente. Em suas palavras: “o passado é interessante não só pela beleza que dele souberam extrair os artistas para os quais ele era o presente, mas igualmente como passado, por seu valor histórico”. Os trajes antigos que hoje nos provoca riso carregam consigo valores de moral e estética de uma determinada época.

Ainda nessa questão, o autor afirma que o homem imprime o que acredita ser belo em seu vestuário, o homem deseja se assemelhar àquilo que gostaria de ser: “o passado, conservando o sabor do fantasma, recuperará a luz e o movimento da vida e se tornará presente”.  A teoria racional e histórica do belo se opõe à teoria do belo único e absoluto e mostra-nos que o belo possui uma dupla dimensão: ele possui elemento eterno e invariável ao mesmo tempo em que possui um elemento relativo e circunstancial

O Artista x O Homem do Mundo

(Quem foi C. G. ?)

Durante toda a reflexão sobre a diferença entre um artista e um homem do mundo, Baudelaire utiliza como exemplo um amigo e o cita no livro como “C.G.” Trata-se de Constatin Guys, um pintor e desenhista autodidata que viveu entre 1805 e 1892, que trabalhou como repórter e foi profundo conhecedor do mundo da moda. Para Baudelaire, C.G. é o típico “homem do mundo” e não apenas um “artista” (num sentido restrito). O homem do mundo é aquele que se interessa pelo mundo inteiro, que quer saber, entender e conhecer. O artista vive no mundo moral e político, o homem do mundo é um cidadão espiritual do universo.

Para o autor, o homem do mundo e a criança possuem muitas semelhanças. Os pequenos enxergam tudo como novidade e estão sempre inspiradas. Enquanto o adulto foi dominado pela razão, a criança é dominada pela sensibilidade. Portanto, o “homem do mundo” é também um “homem criança”, aquele que é dominado a cada minuto pelo gênio da infância e para qual nenhum aspecto da vida é embotado… ele ama a multidão, pois a multidão é um espelho imenso de possibilidades, um caleidoscópio dotado de consciência.

Uma das grandes buscas do “homem do mundo” é a modernidade. A modernidade caracteriza-se pelo transitório, efêmero, contingente. “ A modernidade é a metade da arte e a outra metade é o eterno e o imutável”. Neste sentido, o artista que procura reproduzir uma fórmula (com aqueles que pintam personagens com inspirados em expressões já consagradas) tendem a produzir algo falso, ambíguo e obscuro.

A memória possui um papel fundamental na criação e na originalidade. Para o autor, “todo os bons e verdadeiros desenhistas desenham a partir da imagem inscrita no próprio cérebro e não a partir da natureza”. A memória e a imaginação estão interligadas, e permitem que o desenhista se torne mais anárquico e imparcial.

O Dândi x A mulher

Tanto o Dândi e a Mulher foram figuras (ou objetos) de arte atemporal que serviram de inspiração para os artistas da modernidade. Os dois podem ser encarados como elementos de representação que perduram no tempo e que mesclam dois conceitos importantes trabalhados no texto: moda e beleza.

O dândi é aquele que cultua as próprias paixões e a sí mesmo, mas para fazê-lo precisa de dinheiro. Não porque o dinheiro é indispensável, mas é algo que o permite alcançar o símbolo da superioridade aristocrática de seu espírito. Sua imagem nos remete ao típico rico ocioso, um homem entediado e que sofre por ser homem.  Ele nunca pode ser vulgar. Conforme explica Baudelaire:

 “ O dandismo aparece sobretudo nas épocas de transição em que a democracia não se tornou ainda todo-poderosa, em que a aristocracia está apenas parcialmente claudicante e vilipendiada. Na confusão dessas épocas, alguns homens sem vínculos de classe, desiludidos, desocupados, mas todos ricos em força interior, podem conceber o projeto de fundar uma nova espécie de aristocracia, tanto mais difícil de destruir pois que baseada nas faculdades mais preciosas, mais indestrutíveis, e nos dons celestes que nem o trabalho nem o dinheiro podem conferir” (BAUDELAIRE, p. 872, 1996)

Como modelo artístico, a mulher é quase uma divindade. Encarada como símbolo da beleza natural e por vezes pura, ela transmite luz e um convite a felicidade. O seu porte, seus movimentos, seu tecido… todos esses aspectos nos remetem à harmonia. Porém, ao mesmo tempo, as mulheres podem parecer mágicas ou até sobrenaturais, especialmente quando está diante da necessidade de ser adorada.

Neste caso, assim como o citado acima, a indumentária (e os adereços) é fundamental para indicar a época em que o personagem viveu. Diante disso, Baudelaire também realiza uma reflexão acerca da maquiagem. Afinal este “artifício” possui como objetivo e por resultado fazer desaparecer da tez todas as manchas que a natureza semeou.

O autor defende a ideia de que as pinturas para o rosto não devem ser usadas de uma forma vulgar, no sentido de imitar uma beleza artificial. A maquiagem não pode ser encarada como um artifício para dissimular um aspecto, “pode exibir-se não como afetação, mas como espécie de candura”.

 

REFERÊNCIAS

BAUDELAIRE, C.  Sobre a modernidade:  o pintor da vida moderna. 4 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996

MANTOLVANI, R., Resenha: “O pintor da vida moderna, de Baudelaire”.  Disponível em: http://escrita-das-mulheres.blogspot.com.br/2007/02/resenha-o-pintor-da-vida-moderna-de.html [Acesso: 21 de maio de 2016]

Uma série imperdível: “Quem ama não mata”

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Meu professor comentava muito sobre “Quem ama não mata” durante as aulas da pós-graduação. Trata-se de uma série produzida pela Rede Globo em 1982 que retratava cinco casais de diferentes faixas etárias e seus problemas conjugais. O principal deles, Alice e Jorge, interpretados por Marília Pera e Cláudio Marzo, viviam uma crise profunda. Ela não conseguia engravidar e acreditava ter algum problema, quando na verdade, ele não podia ter filhos. A série, que foi transmitida em 20 episódios (todos eles estão no Youtube), serviu de inspiração para “Felizes para sempre?”, protagonizada por Maria Fernanda Cândido, Paola Oliveira e Enrique Diaz.

Eu assisti e me apaixonei, achei realmente incrível. Todos os personagens, em sua carga dramática, possuem um quê de questionamento social, especialmente as mulheres. Tão diferentes e ao mesmo tempo, muito parecidas em alguns pontos. Logo no primeiro capítulo recebemos a pista de que um dos personagens foi assassinado e que este crime foi passional. Na época, o Brasil ainda vivia as sombras do assassinato da Angela Diniz…

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Este tipo de produção ainda estava em uma fase experimental na Globo, essa é a terceira série lançada pela emissora. As temáticas de “Quem ama não mata” são tão atuais que é difícil acreditar no ano em que foi lançada. Além de um retrato  da emancipação feminina, do abuso sexual e de relacionamentos abusivos, a série trazia suavemente uma reflexão sobre o aborto.

Marília Pêra esta muito linda e extremamente feminina, incorpora a típica mulher do lar que gasta os dias se dedicando a vida doméstica, que depende financeiramente do marido e que sonha com a maternidade. Susana Vieira interpreta sua irmã e vai na contramão da personalidade de Alice. Laura é a mãe imperfeita que fica longos dias sem ver as filhas (criadas pelos avós), e alimenta um relacionamento instável. Júlia, interpretada por Denise Dumont, é uma das filhas de  Laura e sugere um relacionamento aberto à seu marido após se apaixonar por outro homem, é uma jornalista em começo de carreira sedenta por conhecimento.

Através dos pais de Alice, a série debate a sexualidade na velhice e o processo de envelhecimento em sí. É difícil não comparar “Quem ama não mata” com “Felizes para sempre?” e me impressiona a maneira em que o olhar sobre a velhice (especialmente feminina) tem se transformado. Na primeira versão, os pais são conservadores e encaram a velhice como um “momento de descanso” a qual enxergo como uma preparação para a morte.

Na segunda versão, o casal vê a velhice como uma oportunidade de fazer aquilo que não fizeram quando jovens. E em relação a mulher, a Norma, ainda há uma questão importante: o marido não consegue satisfazê-la sexualmente e o casal entra em conflito quando ela, professora universitária, é assediada e se sente atraída por um professor mais jovem.

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A reflexão sobre a maternidade realizada na série é algo que me encanta. Alice possui um desejo incontrolável de ser mãe, mas acima de tudo, se sente na obrigação de fazê-lo para agradar o marido e satisfazer a família. E é através desse desejo que ela passa a ser controlada pelo marido, que depois de se descobrir infértil, assume uma postura extremamente machista, impedindo a esposa de sair e exigindo que ela se comporte de determinada maneira. A falsa ideia da vida perfeita através da maternidade é quebrada pela figura de Laura, que é uma péssima mãe e que provou, de todas as maneiras, não ter nascido para o “ofício”.

Ainda há um personagem que eu adoro, trata-se de Yara, interpretada por Ângela Leal. Em determinado momento da trama, ao desconfiar de sua infertilidade, o marido de Alice procura Yara no intuito de saber o que aconteceu com o filho que tiveram juntos, anos atrás. Ao vê-la ele se surpreende pois quando jovem, era uma menina pobre e sem instruções. “Fiz um aborto”, ela diz para ele, ostentando um cargo alto em uma empresa de empréstimos e ainda completa “O filho não era seu”.

Então é isso, fica a dica da serie… que achei inteligentíssima e cheia de questionamentos sociais. Se gostarem, espero que voltem aqui para comentar!

:*

Canalla de mis noches

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Marisa Medina foi uma comunicadora espanhola que fez muito sucesso na década de 1960 e 1970, mas que acabou em ruína após se viciar em jogos e drogas. Comprei este livro sem saber de quem se tratava e confesso que o que me chamou atenção foi o titulo. Terminei de lê-lo hoje e fiquei com muitas impressões, li o livro em poucos dias porque não conseguia me desgrudar dele. A história, uma autobiografia, é contada em primeira pessoa, com um toque muito emocional. Nos primeiros capítulos Marisa narra a sua vida  de dentro da clínica de reabilitação, quase como em formato de diário.

A sua relutância em permanecer naquele lugar e o confronto da família em relação aos seus vícios são muito dramáticos. Em todos os momentos Marisa mostrava a importância da opinião de suas filhas, o que a levou a aceitar a reclusão. Porém o ambiente da clínica, em princípio, lhe causou repulsa. Ela não conhecia aquelas mulheres (bem mais jovens que ela) e não conseguia acreditar no discurso daquelas que tentavam ajudá-la dizendo que aquele era um ambiente amigável.

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Marisa saiu do mundo luxuoso da fama e se tornou uma mulher comum, viciada, perdida nas noites de jogatina. Eu gosto muito da maneira com que ela mescla essas duas realidades….e confesso, é quase impossível não ter uma “curiosidade mórbida” sobre o que lhe aconteceu. Como uma mulher linda, rica e famosa conseguiu chegar ao fundo do poço? Ela perdeu todo o dinheiro, as casas, os restaurantes, a beleza…

Um dos momentos que mais me agrada no livro é a recordação da infância, quando Marisa relembra a influência da sua avó materna em sua educação, da fraqueza de sua mãe diante da avó extremamente rígida e da ausência de seu pai, um homem que morava perto de sua casa e que a via constantemente nas ruas,  mas que a ignorava como se não a conhecesse. Segundo Marisa ela foi criada num mundo cercada de “velhos trites”  e de alguma forma, levou esta tristeza para o resto da vida.

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Ela estreou na televisão em 1962 no programa “Tv Escuela”, depois disso decolou… teve seus próprios programas, foi apresentadora de festivais musicais, gravou cds e participou de alguns filmes…Casou-se com o compositor Alfonso Santisteban em 1970 e, de acordo com o livro, vivia cercada de regalias, frequentava muitas festas, seus melhores amigos eram famosos e a imprensa a assediava a todo momento. Com Alfonso teve três filhas, cada uma nasceu em um momento diferente de sua vida financeira: Sílvia, a mais velha, vivenciou os dias de fortuna e do casamento perfeito, Alejandra presenciou as primeiras brigas e Laura, nasceu quando o casamento já anunciava um fim e quando a situação financeira já não era tão boa.

Marisa expõe a sua mágoa em relação ao marido que a traía constantemente e que chegou a colocar uma mulher em sua casa, sendo ela sua amante (com ela teve filhos, inclusive). Por isso Marisa deixa bem claro que já não existia um encontro sexual entre os dois, portanto, se relacionava com outros homens sem culpa. Ela também fala de seus desejos eróticos de uma maneira muito aberta.

O livro foi escrito em 2002 e ela me soa muito sincera, todo o tempo; como alguém que já não tem mais nada a perder. É muito louco pensar que ela morreria onze anos depois, aos 69 anos, de câncer. Do pouco que li das críticas, o livro deixou Alfonso extremamente descontento, ele dizia não conseguir reatar a mesma relação com a ex-esposa depois do que foi dito, mas que permaneceu ao seu lado durante sua morte.

Uma manhã gloriosa

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Sou muito preconceituosa com capas de livros e não teria lido este se ele não estivesse dando sopa lá em casa. Mas as coisas são loucas e parece que certas leituras caem como luva na nossa vida, de certa forma, vivo m momento muito parecido com o da personagem principal.. “Uma manhã gloriosa”, livro escrito por Diana PeterFreund e baseado no roteiro de Aline Brosh McKenna, conta a história de Becky Fuller, uma jornalista que trabalha como produtora em um programa de TV matinal e é surpreendida com uma demissão. Em busca de um nova oportunidade, ela se muda para Nova York para encarar um desafio: fazer com que o Daybreak faça sucesso. O problema é que o Daybreak é um programa de péssima audiência, com poucos equipamentos e uma equipe que não se entende. A história virou filme em 2010, protagonizado por Rachel McAdams, Diane Keaton e Harrison Ford.

Por mais que o livro apresente uma história super previsível, algo me fez gostar muito dele. Primeiro pelo senso de humor da personagem principal, de sua busca pela independência. Becky é uma mulher jovem, mas com experiência no que faz… e mesmo assim  é sempre desacreditada pelos colegas. Segundo é que, como jornalista, entendo perfeitamente como esse ambiente é estressante. Fora a correria para colocar uma matéria no ar (e uma matéria que preste), há sempre muitas brigas de ego e uma enorme cobrança. Não é fácil, não mesmo!E este livro vem para brincar um pouco com isso, tirar o pano do mundo das ilusões.

Outro detalhe que me encantou é crítica em relação as diferenças salariais entre homens e mulheres que trabalham nesse meio. No caso, a diferença entre o salário entre os dois âncoras do programa é gritante: mesmo a mulher  sendo uma profissional maravilhosa e disposta a fazer qualquer coisa. Por mais que possa abrir caminhos, o filme não se destina a tratar o tema com seriedade. Também há uma discussão muito interessante (não profunda, mas legal) sobre a relação do jornalismo e do entretenimento, do velho e do novo jornalismo, das adaptações às redes sociais e da rapidez da notícia.

Lótus

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Eu esperei muitíssimo para ver Lótus (de Cristiano Trein), um curta metragem brasileiro, produzido em 2006. O lance é que o Porta Curtas é um site com um acervo sensacional, mas que nem sempre funciona (o que é muito irritante!). Foram anos procurando pelo vídeo até que, depois de uma longa pesquisa, o encontrei no Vimeo.

O filme é protagonizado por Bete Coelho (que por sinal, ganhou o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Gramado) e Marcello Antony, os dois dão vida à Letícia e Fábio… um casal em crise. Fábio morre de ciúmes de Letícia e possui devaneios com a possibilidade de ser traído. Letícia, por outra lado, possui uma frieza em relação ao marido e tenta, de todas as formas, alimentar seu desejo sadomasoquista. Acredito que daí venha o nome do curta, todo mundo sabe que a flor de Lótus é considerada sagrada em algumas culturas, que significa pureza. O que nem todo mundo sabe é que a água que acolhe a planta normalmente é associada ao apego e aos desejos carnais.

Li muitas resenhas relacionando o filme a uma história picante e sexy. Não sei se é viagem, mas consegui perceber um tom romântico, meio de amor não correspondido. Claro, há uma sensualidade evidente, mas há uma trama muito mais cruel e profunda por trás disso tudo.  – Antes de qualquer coisa, eu achei que a Bete ficou perfeita para o papel, e é por causa dela que queria tanto assistir o filme. Ela me parece ser consciente de sua imagem e segura do que quer, tranquila para conversar sobre sexualidade sem julgamentos, sem tabus. Vejo uma força nela, algo que não me soa forçado…um pouco parecido com o que a Marisa Paredes tem.

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Em Lótus, Fábio persegue Letícia quando ela sai do trabalho e a encontra transando com outro homem. Antes disso, no dia anterior, sonhara que a matava no estacionamento do prédio. A perseguição vai ficando mais densa quando ele descobre que ela frequenta uma casa de sadomasoquismo, daí decide transar com outra mulher (talvez por vingança, por vontade ou para provocar ciúmes na esposa). Todo o filme e o jogo de gato e rato entre os dois me pareceu muito cruel, deve ser um inferno viver um relacionamento em que não se tem confiança no outro e que ainda, se disputa algo que não deve ser disputado. Há solidão demais entre os dois, um distanciamento absurdo. O masoquismo está ali, em um fazendo o outro sofrer emocionalmente.

Uma das minhas maiores referências cinematográficas sobre sadomasoquismo é A professora de piano, com a Huppert. Acredito que, mesmo não sendo tão profundamente abordado, Lótus se assemelha com o filme quando quebra alguns estereótipos por apresentar uma mulher comum, sadomasoquista. Nenhuma das duas personagens faz o tipo daquelas gostosonas, peitudas e com saltos altíssimos que ficou tão colado a nosso imaginário através da Bettie Page…

O evangelho segundo o Filho

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Este é um dos livros que mais gostei de ler nos últimos tempos, fiz um mergulho em cada uma das páginas e me emocionei muitas vezes. Li uma crítica sobre ele na Folha de São Paulo que, resumidamente, dizia que a obra foi escrita de maneira superficial demais. Talvez tenha sido exatamente isso que me conquistou, a leveza do texto, a dinamicidade da história, o fato de ser uma literatura descomplicada e a abordagem sobre o lado humano do personagem principal: Jesus Cristo.

O livro possui passagens conhecidas, mas é escrito em primeira pessoa e apresenta um Jesus muito mais palpável, verdadeiro, com dúvidas, dores e tristeza…e muita bondade. Nos capítulos inciais Jesus ainda é um adolescente, mas percebe que há algo errado (ou melhor, diferente) em sua família: que seu pai e sua mãe escondem algum fato. Sua educação é rígida e ele passa os dias com seu pai, José, um homem honesto e muito sério, que o ensina a ser carpinteiro. Maria é um personagem importante, mas que aparece pouco e em momentos fundamentais, gosto da visão dele sobre as mulheres e o respeito que elas lhes transmitem.

O livro me remeteu à muitas histórias que ouvi quando criança, especialmente na minha escola (muito católica). Mas, foi como ver o outro lado da moeda e perceber em Jesus um ser muito mais caridoso e amoroso do que há anos e forçosamente me foi ensinado.

O batismo, os milagres, as escolhas dos discípulos, o encontro com Maria Madalena….As duas passagens que mais gosto mostram que Jesus, ainda que tenha tido medo, nunca duvidou de Deus ou deu um passo em falso. Por exemplo: sua insegurança em falar para aquela multidão o fez rezar muitas noites, até que pudesse ter coragem de fazê-lo e quando o fez, o fez muito bem. Ou… sua certeza de que um de seus discípulos o trairia e ainda assim, os amou e lhes passou seus conhecimentos.

É um livro lindo, que me encheu de esperança e me fez relembrar a importância do amor, da compaixão. Recomendo muitíssimo!


Sobre Norman Mailer, o autor:

Nascido em 1923 em Long Branch, Mailer foi um dos nomes do Novo Jornalismo (uma vertente da literatura de não-ficção, enraizada na grande reportagem.) Vencedor de dois prêmios Pulitzer e autor de obras polêmicas (como “Os nus e os mortos”, 1948  e “A canção do carrasco”, 1979). Quando jovem, iniciou seus estudos em engenharia aeronáutica em Havard e enveredou-se pelo mundo da comunicação ao ser convidado a participar de um jornal universitário. Um de seus livros mais vendidos foi “Marilyn: uma biografia”, onde o jornalista dizia que a atriz fora assassinada pela CIA e pelo FBI e que teve um caso com o senador Robert Kennedy. Mailer morreu em 2007, aos 84 anos por problemas pulmonares.

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Eu não faço a mínima ideia de onde estou indo ou de onde eu deveria estar indo. Não tenho certeza de praticamente nada, dúvidas me cercam todos os dias. E me impressiono quando converso com pessoas da minha idade que se viram perfeitamente bem, que parecem ter certeza do que querem. Eu sinto saudade de tudo, de todos. Ao mesmo tempo desejo ser livre e preciso de um tempo sozinha. De ter o meu espaço. Meu. Tenho sentido os dias infinitamente mais belos, mas também mais carregados. Um abismo entre o que pareço ser, o que sou e o que desejo . Uma vontade de ficar, e de ir…

Bette Davis, Joan Crawford, Susan Sarandon e Jessica Lange!

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53-18276-bettedavis_joancrawford-1405554457A notícia da realização da série Feud mexeu com a minha cabeça. Me deixou doida, doidinha, louca! Susan Sarandon e Jessica Lange representando as disputas entre  Bette Davis e Joan Crawford durante a gravação de “O que terá acontecido a Baby Jane?”. São quatro das atrizes que mais adoro, das quais já assisti inúmeros filmes e acompanho há anos. Quer dizer, meus miolos entraram em erupção. Na verdade eu até já sabia da possibilidade deste projeto, tive conhecimento dele (através das redes sociais em 2014!), mas achei que não iria para frente… Esperei todo o burburinho passar para ver se os veículos de comunicação e os próprios atores/diretores confirmassem. Isso aconteceu e eu morri. Já escrevi inúmeras publicações sobre Baby Jane, sobre Bette, Crawford, Susan e Jessica… acho que seria chover no molhado. Só passei mesmo para dizer que estou super entusiasmada pela série, que deve ser lançada no ano que vem e dirigida por Ryan Murphy (o mesmo diretor de American Horror Story!!).

Uma relação delicada

Assisti mais um filme da Isabelle Huppert e fiquei, mais uma vez, encantada com a competência dessa atriz. Digo competência porque ela me parece muito segura e entendida do que quer fazer e do que é preciso ser feito. Admiro muito o artista que abre mão da beleza e do glamour para representar um personagem. Como a Bette Davis, por exemplo, que quando jovem e no auge da carreira, raspou os cabelos para interpretar a Rainha Elizabeth I. Huppert faz isso neste filme, lança-se corajosamente a interpretar uma cineasta que sofreu um AVC e ficou com sequelas na fala, no caminhar…

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Numa mistura de autobiografia e metalinguagem, o filme conta a história de Maude, uma cineasta que sofre uma hemorragia cerebral e fica com severas limitações físicas. Em busca de restabelecer a carreira e a vida pessoal, Maude mergulha em um projeto televisivo e acaba se relacionando com um dos atores, mas sofre pelo relacionamento extremamente abusivo, que a deixa em situação de ruína financeira.

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Li inúmeras críticas do filme e concordo com as que dizem que apesar da presença da Huppert e de sua interpretação intensa, o filme passa despercebido por apresentar personagens antagonistas pouco desenvolvidos e por ter uma abordagem superficial de certos acontecimentos. Como um pequeno quebra-cabeça, Catherine Breillat (a diretora) vai nos indicando certos fatos, sem trabalhá-los muito, apenas com poucas pinceladas. E logo, estamos em outra cena, em uma situação bem diferente.[É isso…talvez esse espaçamento seja um problema. Eu não sei, conheço muito pouco do trabalho da Breillat, mas acredito que esse tipo de narrativa possa ser uma de suas marcas.]

No filme, Viko, o personagem com que Maude se relaciona é odioso do começo ao fim e é realmente difícil e incômoda a maneira com que ela vai liberando seu dinheiro, ainda que ele a trate super mal. Há uma dor no personagem que não é dita explicitamente, só se percebe nos pequenos detalhes, na baixa auto-estima, no medo de não conseguir voltar a ser quem era.  Ao mesmo tempo, é uma mulher que busca forças para continuar vivendo, sobrevivendo e existindo.

Bom… eu gostei do filme, mas esperava mais. Você já assistiu? Me conta aí o que achou!