Tenho uma profunda admiração por Drauzio Varella especialmente pelo respeito e humanidade que ele possui em relação aos seus pacientes. Gosto de ler seus artigos, assistir seus vídeos no Youtube e me informar sobre os projetos que desenvolveu no Brasil em relação à AIDS. Do pouco que conheço sobre assuntos de saúde, me admira a maneira em que ele trabalha com uma linguagem simples e acessível, de forma em que se coloca de igual para igual diante do espectador. Recentemente (para ser mais precisa, ontem à noite), terminei de ler “Carcereiros”, livro lançado em 2011 onde o médico narra algumas de suas experiências em presídios. Dentre elas, a sua experiência de voluntariado no Carandiru.
O livro possui um forte tom jornalístico e uma narrativa dinâmica, cheia de diálogos. Além de um registro de memórias, é também uma obra de denúncias sociais. Foi um livro que me fez refletir sobre questões que nunca parei para pensar, porque de alguma forma, estão distantes do meu cotidiano. Drauzio deu rosto e nome aos carcereiros, que realizam um trabalho dificílimo, de muita importância social e que não recebem o devido reconhecimento. É incrível como esses homens e mulheres colocam a vida em risco diariamente, como eles acabam se “endurecendo” com a rotina, como se dividem em dois mundos muito diferentes e igualmente cruéis. Imagine ter que viver grande parte do dia em um local onde, do outro lado das grades, estão ladrões, assassinos e estupradores. Seres-humanos vivendo em situações degradantes, em celas superlotadas e anti-higiênicas. Fora o sistema que é extremamente corrupto e o jogo (enlouquecedor) de caça entre gato e rato.
Durante a narrativa, Drauzio vai misturando alguns acontecimentos com a história dos carcereiros. Como o do casal que resolveu deixar de trabalhar na prisão e abrir um bar, até serem assassinados. Ou o carcereiro que se envolveu com a mulher, estelionatária, de um dos presos e passou a ser perseguido por ela. As histórias são muito marcantes e talvez a que tenha mais me agradado seja a da negociação entre um diretor e dois presidiários – que se rebelaram dentro da cadeia exigindo a transferência para outro presídio (se ficassem onde estavam, seriam assassinados). Mas nessa narrativa, há muita obscuridade (tanta que me tirou o sono). Por exemplo: em um momento, o autor descreve quando encontrou um corpo extremamente ensanguentado com perfurações no pescoço ou o tratamento que os presidiários recebem na ala psiquiátrica.
É um livro que absolutamente me ajudou a ver o mundo de outra forma, além das fronteiras em que vivo. Há muito mais do lado de lá, e nem tudo é tão bonito quanto imagino. O ser humano pode ser extremamente cruel…