Encontrei o livro da Lena Dunham em promoção na Fnac, apenas 19,90. Não poderia deixar de comprá-lo, já havia tempo que tinha curiosidade para lê-lo. Acompanho a página da editora Intriseca pela internet e sempre assistia algumas pílulas feitas pela Lena em que ela respondia perguntas dos leitores. Ela me pareceu muito simpática, descontraída…
Então, como sempre faço, atropelei minha lista, interrompi algumas leituras e passei este livro na frente. Logo no princípio, tive uma boa surpresa, uma linda citação retirada do livro Madame Bovary. Também gostei dos divertidos títulos dos capítulos como: “Tira minha virgindade (não, sério, tira)” ou “Fixação por garotas:naquela época em que quase fui lésbica, depois vomitei”.
Reparei que ela fala muito e basicamente sobre sexos e/ou relacionamentos amorosos. E fala de uma forma diferente… Sem amarras, sem medos. Contando detalhes íntimos que deixam o leitor até meio sem jeito. Lena também relembra muitos momentos do colégio, e da universidade – da época em que trocava de parceiros facilmente e que já havia dormido com praticamente todos os colegas. Ela, que veio de uma família de artistas, parece que foi criada em um ambiente muito liberal onde se comentava de sexo livremente: sem vergonha ou culpa.
Também é curioso a narrativa sobre a sua iniciação na TV e as consequências que Girls (uma série da HBO, dirigida por ela) trouxe para sua vida. Antes mesmo de publicar o livro, Lena recebeu U$3.5 milhões, já pensou? Pouco após o lançamento, surgiu uma polêmica sobre um dos casos contados por ela… em uma de suas lembranças, Lena conta que quando criança inspecionava a vagina da irmã. A crítica caiu matando, acusando-a de ter abusado sexualmente da garota.
Bom… agora que já falei dos “prós”, pulamos para os “contras” . Ao logo da leitura fui me decepcionando um pouco, apesar dos temas chamarem atenção – a autora simplesmente não conseguiu me prender na narrativa. Não achei suas histórias interessantes e me identifiquei com muito pouco (ou quase nada) do que ela contou. Lena me pareceu uma menina mimada, um jovem que é moderna porque precisa disso para não cair em uma crise existencial e as lembranças (a maioria escolares) me pareceram bem bobas. Quer dizer, eu esperava SIM, um livro mais autoral, mais desafiador, com mais referências e questionamentos…
Paul e Gina, 2ª Temporada: Na segunda temporada, o surgimento de Paul no escritório de Gina é tão inesperado quanto na primeira. Mas dessa vez, o enfoque da relação dos dois está ainda mais interessante. Paul surge pedindo que Gina aceite depor em seu favor. Um de seus pacientes cometeu suicídio e ele foi processado por negligência. Na verdade, o processo é um grande risco para Paul: caso seja julgado como culpado precisará pagar uma fortuna e ainda, perde a licença. Ele afirma diversas vezes que está cansado dos pacientes e que não quer continuar com o trabalho. Seus questionamentos são diretamente jogados sobre Gina, como se ele buscasse nela, a solução para os seus problemas. Os diálogos, como na primeira temporada, são carregados de um coloquialismo muito interessante que reforça a ideia de familiaridade entre os dois. Além disso, o clima fica ainda mais empolgante com o encontro de Paul com Tammy Kent. (Tammy foi uma antiga namorada de Paul e “coincidentemente” é paciente de Gina).
O livro de Gina foi um sucesso de crítica, mas Paul afirma que ainda não está preparado para lê-lo. O primeiro encontro dos dois é apenas amigável e mesmo assim, Paul volta a questiona-la sobre a psicologia. “Você não se cansa de escutar as pessoas?” Sua presença naquela sala, como diria momentos depois continua sendo um pedido de ajuda (ainda que repleto de arrogância). Paul revela que sua vida é um grande caos (está se separando da mulher, tem problemas com os pais e quer largar à carreira). Há uma extensa reflexão sobre a temporada anterior: Paul afirma que não entende como se deixou cegar de amor por uma paciente (Laura) e de alguma forma, se permitiu ultrapassar as barreira éticas da profissão (o que Gina ‘religiosamente’ chamava de essência).
A segunda temporada expõe discussões muito mais interessantes e é impossível não prender a atenção em cada episódio. Um conhecido meu, que inclusive indicou a série, disse uma coisa certíssima: os diálogos são à base da produção inteira e talvez, por isso, temos a impressão de ser um programa lento. Na verdade, InTreatment não é uma série pra qualquer um: as cenas são carregadas de diálogos e reflexões complexas sobre a vida, sobre a família, sobre a morte, etc…
Em um dos episódios, Paul está completamente desnorteado porque não sabe o que fazer com o pai doente. Suas lembranças o fazem recordar das diversas crises nervosas da mãe, que era bipolar. Enquanto Paul via sua mãe definhar emocionalmente, seu pai (que era médico) se encontrava com outras mulheres. A dor reprimida pelo personagem quase transborda em seus diálogos. Ele se nega a visitar o pai, com medo de ser rejeitado novamente. Gina percebe claramente que Paul transfere esse medo para os filhos: ele teme não ser um bom pai.
Paul: Eu sinto ódio dele.Gina: O seu ódio nasceu para você se proteger da rejeição. Você não tinha escolha, ele era o único que tinha escolha dentro daquela casa.
O pai de Paul falece e todo o sentimento sobre o passado vem à tona. Com muita raiva, Paul se lembra de sua ausência e de seu descomprometimento com a família. Ele começa a se questionar se o amor que o pai tinha por ele era verdadeiro. Sabiamente, Gina o faz pensar sobre o outro lado da moeda. Um médico que não consegue curar a própria mulher percebe seu fracasso e acaba refugiando-se em outras coisas. “A morte deixa muitas perguntas sem respostas, ninguém nasceu pronto para ser pai”. Paul começa a destruir o muro sobre seus sentimentos, confessa que pediu perdão ao pai antes de vê-lo morrer. Gina então tem uma reflexão belíssima. Ela afirma: “Uma das coisas mais confusas em problemas emocionais em uma família é que pode parecer injusta e aleatória. Como um acidente em uma estrada. Todos estão no carro, mas você foi o único que atravessou o vidro”.
Meu pai me amava, então ele fez o que pode?-Não, seu pai te amava e ele fez o que fez… E você o amou e o odiou porque ele te ignorou. Não se pode racionalizar o amor.
Na segunda temporada há também um momento marcante. Apesar das inúmeras ofensas que escuta de Paul, Gina sempre se porta com elegância e paciência. Só há um momento em que ela não consegue se segurar e acaba discutindo com ele. Paul volta a repetir que Gina é uma mulher fria, que não se preocupa com os pacientes e que não dá a mínima para o que eles estão sentindo. Ele a acusa de ser uma psicoterapeuta ortodoxa que julga seus pacientes ao invés de ajudá-los. Gina não aguenta a pressão e finalmente diz o que realmente acha de Paul. Depois de chama-lo de idiota e de “pé-no-saco”, Gina revela que a terapia dele avançou muito pouco e que seu trabalho tem interferido no seu comportamento. Por fim, conclui que Paul quer que Gina faça o papel de pai (autoritária), que Gina o rejeite para que ele possa se sentir inocente e que ela diga quem ele é e o que fazer. “Você vem aqui toda semana e despeja em mim as mesmas porcarias de sempre.’
O último encontro do dois é de uma sutileza muito grande. O episódio inicia-se com Gina lendo uma carta onde Paul renuncia a profissão e assume sua responsabilidade sobre a morte do paciente. Ela guarda a carta na gaveta e tranca como garantia de que aquelas afirmações nunca sejam publicadas. No encontro, Paul relembra os tempos de faculdade, quando ele e os colegas estavam apaixonados por Gina. Eles queriam saber onde ela morava, se era casada e se tinha filhos. Um dia, Paul encontrou Gina e seu marido em um restaurante e ficou se perguntando porque ela estava casada com ele. Os dois se lembram de como brigavam na sala de aula. “Você discutia sobre tudo o que eu falava”, “Sim, mas você nos fazia discutir, essa era a sua técnica”. Depois de insistir muito, Paul descobre que Gina tem um encontro, que ela está tentando recomeçar.
Paul: Você é uma excelente terapeuta Gina, eu não sobreviveria sem você.
Gina: Obrigada. Paul, esta seria a hora em que eu deveria dizer: ‘A minha porta está sempre aberta’, mas eu não vou dizer isso.
Paul: Eu entendo…
A série de alto padrão da HBO Latino-americana surpreende pela delicadeza em que as situações são representadas.
Personagens riquíssimos se interagem em um cenário obscuro de historias pessoais ainda mais chocantes. São mulheres que (fatalmente ou não) tiveram a vida drasticamente transformada após serem presas em Capadócia, um presídio mexicano, cuja diretora Teresa Lagos, tenta sensivelmente defender os direitos das reclusas e torna-las um pouco mais humanas.
As representações são divinas e os personagens parecem muito próximos das “pessoas de carne e osso”, convivendo diariamente com o lado animalesco e violento do ser humano, que quando está trancafiado em uma cela, perde em parte, o senso de espaço e integração social
O drama das detentas mantém o clima de ação e suspense sempre vivo. Dos melhores personagens (que por sinal, são muitos), não se pode deixar de citar “La Negra”. A agente penitenciária de caráter duvidoso torna-se por vezes engraçada no duro (me arriscaria a dizer: cruel) tratamento que dá as detentas. Utiliza-se de força bruta desnecessária e além do assédio sexual com as reclusas, envolve-se na exploração da força de trabalho e da mão de obra barata.
O drama pessoal do Drº José Burian, psiquiatra do presídio é fascinante. Filho de uma prostituta e um padre tenta esconder a todo o momento seu passado maçante que se tornou ainda mais cruel, quando sua mãe foi presa. Burian mostra-se sempre atento aos problemas das detentas, porta-se de maneira generosa com todas elas, mas não resiste a noites de orgias e bebidas.
A obscura “La Negra” interpretada pela atriz Aida Lopez
Não se pode esquecer de Andréa, filha mais velha e problemática de Tereza, que após a separação dos pais, torna-se uma garota rebelde e “insuportável”. Andréa faz de tudo para chamar atenção dos pais, que estão sempre ocupados, o drama da menina vai ficando ainda mais obscuro quando ela se apaixona por um aluno da sua mãe, sem saber que os dois estão tendo um caso.
A representação da penitenciaria pela TV Mexicana ilustra uma situação que não está tão distante do Brasil, são mulheres de várias idades e níveis sociais, confinadas em um local que as torna cada vez mais animalescas (banhos comunitários, celas sujas, sexo, abandono, violência). A exibição da terceira temporada está marcada para o dia 19 de setembro, com exibição no Brasil pelo HBO Signature.