Peixe morto

463-20150721180302Não sei dizer o que senti enquanto lia este livro. Uma curiosidade me impedia de abandoná-lo ao mesmo tempo em que certo asco me fazia não querer acabar de lê-lo. Algo me incomodou profundamente na história e com sinceridade, não sei dizer muito bem o que foi. Ao mesmo tempo, a ambientação me provocou um acalento por causa da saudade que sinto de Minas (principalmente por ser ambientada em alguns lugares que sempre gostei de passear). Então, eu realmente não sei dizer se gostei ou não do livro (o que é meio estranho…).

A trama, que tem um assassinato com tema principal, é cheia de jogos de sedução e mistério. Todos os dias pela manhã, um professor universitário caminhava pela Lagoa da Pampulha, até se deparar com um corpo de um homem boiando. Os detalhes do crime chocam, afinal o homem estava com a boca cheia de acarás (peixes) e com a pele do tronco arrancada desde a base do pescoço às axilas. Não bastasse, o professor conhecia o cara assassinado e por um motivo muito especial, poderia facilmente ser incriminado.

A história se mistura em duas narrativas e a construção delas é como um quebra-cabeça. Os capítulos são nomeados por datas e horas diferentes e ainda há um diálogo epistolar de um fato que se passou antigamente (e que também envolve: peixes e taxidermia).

 

#Tag1 – As coisas que amo no meu quarto

Imagem

Uma amiga, a Sarah, disse que eu devia responder mais “#Tags” no La Amora. Revendo o histórico do blog, ela tem razão: aliás, nunca respondi nenhuma. Ela me mandou uma sugestão por e-mail, acho que já há alguns meses e só agora animei  responder. A ideia é até interessante, não sei se levo jeito pra coisa, mas aí vai: “O que eu mais amo no meu quarto?”

Depois de tirar essas fotos e reparar cada pedacinho do meu quarto, acho que a minha avó tem razão: tem coisa demais aqui. Mas meu quarto é bem isso, uma mistura de tudo o que eu gosto, uma bagunça que só eu entendo, fazer o quê?

1) Meus Filmes:  Coleciono filmes desde os quinze anos, acho que essa mania começou quando ganhei da minha mãe as coleções da Bette Davis e da Joan Crawford. Também gosto de baixar e gravar, perdi a conta de quantos eu tenho – amo todos eles.

Imagem2) Meus livros: Existem duas escrivaninhas no meu quarto e as duas são para guardar livros. Às vezes eu me sento em uma delas para escrever ou desenhar alguma coisa, mas é meio raro. Quando escrevo a mão ou no notebook, gosto de ficar na cama ou na mesa da sala, porque há mais espaço. Pra falar a verdade eu não sei quando comecei com essa mania de comprar livros… só sei que comecei e não parei mais. Adoro ler, seja no celular ou em um livro físico.

Imagem3) Minhas anotações: Tenho o costume de escrever em diários há muitos anos e guardo todos eles. Adoro escrever a mão, uso os “post it’s” para marcar o ano ou alguma data importante. E amo essa ideia, de poder escrever sobre a vida, sobre os sentimentos e guardá-los para a posteridade, para mostrar para meus filhos (quem sabe?). Mais do que isso, meus diários são como psicanalistas, dá pra desabafar.

Imagem

As esganadas

e a relva, Fernando Botero
Mulher nua sobre a relva, Fernando Botero
Dentro de cada mulher gorda
há uma mulher magra suplicando para sair.
 Fora de cada mulher gorda
Há uma mulher mais gorda ainda
Suplicando para entrar.
(Jô Soares)

 

Passeando pela Leitura ontem, encontrei o livro “As esganadas” do Jô Soares em preço promocional e não resisti. Levei para casa e li, em menos de um dia. Hoje de manhã, conversando com uma amiga da faculdade, dizia que se eu fosse uma escritora, era exatamente esse tipo de narrativa que gostaria de construir. Jô Soares consegue ser simples direto e divertido. Ele ainda mistura personagens reais e fictícios em um cenário riquíssimo (com um gostinho delicioso de nostalgia e saudosismo.)

‘As esganadas” é uma obra escrita em terceira pessoa, que se passa no Rio de Janeiro na década de 30, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas. A trama concentra-se no caso das esganadas, mulheres jovens, bonitas que são brutalmente assassinadas. Todas tem algo em comum: são gordas. Outra coisa: todas elas morreram esganadas com comidas e seus corpos são encontrados sem os olhos. O perigoso assassino usa como isca, requintes da culinária portuguesa, irresistíveis aos olhos (e aos estômagos) das jovens senhoras.

Logo no início, o autor nos revela quem é o assassino. Trata-se de Caronte (nome que tem referência ao barqueiro do Auto da Barca do Inferno, cuja função é atravessar as almas dos mortos). Caronte é um homem alto, pálido e muito magro. Ele herdou dos pais a funerária mais famosa da América do Sul, a Esfinge. Sua mãe, Odília Barroso era uma mulher enorme (com quase cento e quarenta quilos) e tinha muito medo de ver o filho engordar. Por isso o obrigava a seguir uma dieta restrita de qualquer tipo de doces ou pratos gordurosos, sem levar em consideração que o filho tinha puxado o metabolismo do pai (e poderia comer de tudo, sem preocupar-se em engordar). Em seu aniversário de dez anos, a mãe, em vez de bolo, pôs na sua frente um prato com meio mamão enfeitado com velas. Num ataque de fúria e ódio, Caronte mata Odília.

Caronte mata inúmeras mulheres brutalmente, mas há dois assassinatos que me chamam a atenção. O primeiro é o da freira Irmã Maria Auxiliadora.  Disfarçado de frade, Caronte disse a irmã que estava disposto a ouvir suas confissões. Ela lhe diz que precisava confessar todos os dias porque sempre comete o mesmo pecado: o da gula. Ele então sai do confessionário e afirma que recebeu de um emissário do Vaticano uma informação do papa: de que a gula deixará de ser um pecado. Em sua felicidade e inocência, a Irmã acredita no falso frade e aceita sua penitência: “a irmã deve ingerir a causa das suas faltas até não poder mais, como se devorasse o mal que lhe consome as entranhas”. Ajoelhada, a freira começa a comer a toda velocidade os pasteis de Santa Clara que o assassino lhe trouxe. Enquanto isso, Caronte fala um falso (e engraçado) latim como estivesse a exorcizando “Exitus Gula Demoninum!” A irmã comendo em um ritimo frenético começa a  tossir, mas não para de comer. Caronte então, pega um punhado de pasteis e lhe enfia goela abaixo. A freira morre esganada.

Outro assassinato que adorei foi o da Greta Sübeschlitz, afilhada do almirante Wilhelm Canaris, chefe da Abwehr. A gorda alemã pertencia a uma rede de espiões que a Abwehr pretendia montar no Brasil. Foi atraída pelo furgão de Caronte que trazia nas prateleiras amostras de salsichas recheadas, morreu engasgada com as próprias tripas. Seu corpo foi encontrado no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, justamente no dia em que encenavam uma peça de Wagner em homenagem ao embaixador alemão Karl Ritter. O corpo nu de Greta foi enrolado nas cortinas do teatro, seu cadáver sem olhos balançava na extremidade da corda, enquanto seus cabelos estavam enrolados em salsichas.

A trama também conta com quatro personagens que se envolvem para resolver o caso. Tobias Esteves era um detetive em Portugal mas foi afastado do cargo depois que envolveu-se (com a ajuda de Fernando Pessoa) em um falso suicídio. O jovem (baixo e roliço) veio para o Rio de Janeiro para abrir uma franquia de doces e faz grande sucesso. Porém sua paixão sempre foi desvendar crimes. Sabendo do caso das esganadas, ele resolve se oferecer para ajudar o delegado Mello Noronha. O delegado, por sua vez, aceita a oferta e junto ao seu outro ajudante, Valdir Calixto (um homem atrapalhado e muito, muito engraçado) saem às ruas para resolver o caso. No meio da trama, surge Diana, a jornalista da revista O Cruzeiro, que não larga a sua câmera Leica

Bom, depois de ver o tamanho desse texto, dá pra perceber o quanto fiquei entusiasmada com o livro. Vá por mim, é muito divertido e descompromissado. Permitam-me reproduzir uma passagem que eu mais gosto:

Capa-de-As-Esganadas-do-Jo-Soares-vertical-original-200x300“Existe um preconceito velado contra a obesidade. Na verdade, dificilmente os homens o sentem. Podem ser gordos inteligentes ou ricos ou oferecem tantos outros atrativos. Quem sofre o problema com maior intensidade são as mulheres. As mulheres gordas. O leitor pode se escandalizar com o uso da palavra gorda. Os eufemismos mais comuns são: cheinha, forte, grande e, o mais usado, gordinha. Geralmente acham que a gorda (odeio a palavra obesa) não tem força de vontade. Nem caráter. Nem vergonha na cara. A gorda é um pária, o excesso do peso, um divisor de águas. O próprio adjetivo é um palavrão. Ninguém se importa com o sofrimento ou com a humilhação da gorda. Acham que ela é gorda porque quer. Observem o olhar triste das moças gordas varrendo as vitrines da moda. Os figurinos são para as magras. Alguns vendedores ainda informam sem se alterar:” Aqui é só pra pessoas normais, madame”. E a gorda se afasta engolindo o ultraje. Restam-lhe as lojas especializadas ou as costureiras do bairro. Para mim, anormal é o tratamento do vendedor. A obesidade é democrática, não faz diferença de classe. Há gordas ricas e gordas pobres. Todas sentem a mesma reprovação silenciosa da sociedade. Existem gordas belas, mas, se a beleza é notada, há sempre um apêndice ao comentário: o rosto é lindo, pena que seja gorda.”