Vidas em Fuga

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Eu preparei uma publicação especial, para falar apenas sobre os filmes feitos pela Anna Magnani. Estava indo tudo muito bem, quando eu percebi que o post foi ficando grande demais, cansativo de ler e difícil até para editar. O último filme que vi com ela, “The Fugitive Kind”, de 1960, foi uma belíssima surpresa e diante das complicações de postagem, decidi separá-lo dos outros. É que há muitos anos não me sentia tão entusiasmada com um filme como me senti com esse e quando terminei de assisti-lo, depois de todos aquelas reviravoltas e de me ver com os olhos marejados (e com um grito preso na garganta), me lembrei de quando tinha quatorze para quinze anos, época em que ficava horas escrevendo nos diários sobre os filmes, sobre os personagens, sonhava com eles, criava histórias secundárias. A verdade é que pouco mudou, mas agora tenho um blog onde posso divulgar meus bobos pensamentos….

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(Sinopse) Marlon Brando interpreta Xavier, um jovem boa pinta que foi preso em Nova Orleans depois de causar confusão em uma festa. Em julgamento ele promete nunca mais cometer um crime que coloque a sua liberdade em risco. Então, ao ser liberado, pega o seu casaco de pele (que é uma de suas marcas e faz alusão à sua índole duvidosa) e viaja em direção à Two Rivers para tentar uma vida nova. Depois de conseguir uma indicação, ele começa a trabalhar na loja de roupas de propriedade do casal Torrance. Lá ele cria uma relação com Lady Torrence (Magnani), uma mulher mais velha, cheia de mistérios e extremamente deprimida por ter que conviver com o seu asqueroso marido, Jabe. E quando digo asqueroso, acreditem! Outro personagem importante é a Carol, uma jovem problemática e mal vista pela vizinhança, que se sente atraída por Xavier. 

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Adoro filmes de romance entre mulheres mais velhas e homens mais jovens. Uma vez ia fazer uma lista dessa aqui no La Amora, mas ela ficou tão grande (e eu vi que não daria conta de escrever sobre todos eles), que desisti. “Vidas em fuga” é exatamente sobre isso, é o retrato de um amor proibido entre um casal com uma grande diferença de idade e de perspectiva. É uma crônica de uma tragédia anunciada, um filme triste pra caramba, que deixa a gente descrente na humanidade, com raiva por tamanha injustiça. Tennessee Williams arrasou, como sempre, mas jogou (e muito) com o espectador. A gente tem conhecimento dos fatos, mas na posição de observadores, não podemos fazer nada para mudá-los. Quem um dia assistir esse filme, se prepare, é um dramalhão!

Fiquei muito admirada pelos movimentos de câmera no clímax, nos diálogos profundos (que me fizeram pensar na vida e no que estou fazendo dela). O personagem do Brando se define como aquele cara que não consegue parar em lugar nenhum. Através da metáfora do pássaro sem pernas, que nunca pode parar de voar ele explica: “se um dia ele parar, ele morre”. Mais profundo ainda é a distinção que ele faz… o mundo é divido entre três tipo de pessoas: as que se vendem, as que nunca se vendem e as que compram.

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Marlon Brando está muito bem nesse filme, sério, concentrado… eu confesso que até comecei a ter uma quedinha por ele, mas descobri que ele sacaneou a Anna Magnani nas gravações, falando um inglês rápido e meio embolado para a confundir. Aliás, achei muito engraçado o fato da Anna ter dado em cima dele e ele se negado a ficar com ela, dizendo que a achava feia, pode?! O fato é que Anna, quando está em um filme, desbanca qualquer um… essa mulher tem uma capacidade dramática que me tira do sério! É impossível ficar indiferente ao sofrimento de Lady e não torcer para que ela se dê bem no final… Também é difícil não ficar ligado na tensão sexual entre os dois, hora um seduzindo o outro, hora ela se esquivando, hora ele fingindo que não quer nada. AH MEU DEUS! Até chegar no momento da transa dos dois eu tive uns mil enfartos!

Um bonde chamado desejo – 1995

Desde que vi “Uma Rua chamada pecado” fiquei marcada pela história. Desliguei o DVD com uma série de pensamentos rondando a minha cabeça e com uma vontade enorme de assistir a peça. Na época, não sabia quem era Tennessee Williams e pouco gostava da Vivien Leigh (por uma bobeira: a relacionava com a imagem da Scarlett O’Hara e ficava antipatizada, porque não me agradava o personagem).

Também nunca tinha assistido a um filme sequer com o Marlon Brando e não fazia ideia sobre aquele lado magnético dele. Agradeço ao homem da loja que, no dia em que comprei o DVD me disse: “Não se pode dizer que gosta de cinema, sem ter assistido uma produção como essa”. Eu realmente não poderia deixar de vê-lo – aliás, foi com ele que aprendi que o cinema e o teatro possuem ligações fortíssimas. umbondechamadodesejo_09Existem algumas produções que falam por entrelinhas, que contam histórias escondidas atrás dos pequenos detalhes. “Uma rua chamada pecado” (e aqui, me refiro a versão de 1951) é exatamente uma delas, que teve diversas cenas e diálogos cortados – como aquela excepcional do clímax, onde Stanley estupra a cunhada.  A mudança do título é por sinal muito interessante, já que “Um bonde chamado desejo” guarda diversos sentidos. E, convenhamos: Desejo e Pecado são duas coisas bem diferentes, ainda que relacionadas.

Não poderia entrar no méritone_93409 de análise porque sei que existem diversos textos na rede que são muito mais informativos e completos. Mas é que, finalmente, assisti a versão de 1995, estrelada por Jessica Lange, Allec Baldwin, Diane Lane e John Goodman e aquela mesma sensação que tive há alguns anos atrás, quando vi a versão de Elia Kazan, voltou.

Apesar do meu amor pela Jessica Lange, não existe nenhuma Blanche Dubois que se iguale a da Vivien (pelo menos pra mim, é claro). E digo isso, porque logo quando comecei a ver a segunda versão, fiquei impaciente ao ver Lange interpretando a Blanche. É realmente difícil se desvencilhar de uma imagem já construída e mais difícil ainda quando ela é bem feita. Lange aparece tímida, talvez até um pouco exagerada e aos poucos, vai pegando tom da personagem (do qual, já viveu nos palcos) até que nos consegue convencer e nos deixar tocar.

Eu digo isso porque também não queria deixar o meu braço torcer por Allec Baldwin e quando ele aparecia em tela o olhava com desdém, até que quando me dei conta, estava vidrada na tela, como se nunca tivesse ouvido falar daquela história. No fim das contas, eu acho que sempre vai ser um desafio fazer uma releitura de um clássico e não esbarrar em suas “perfeições” e a segunda versão  de Um bonde chamado desejo (que chegou a ganhar um Globo de Ouro, mas que posteriormente caiu no esquecimento, passa por esse caminho).

“Eu não quero realismo. Eu quero magia! Sim, sim, Magia!”
Vivien-Leigh-as-Blanche-DuBois-Vogue-15Aug13-VandA_b_1440x960Annex-Brando-Marlon-A-Streetcar-Named-Desire_03Sobre a segunda versão, gostei especialmente do ambiente, todo feito em cenário montado, interno. É visível a mudança das luzes, mas a artificialidade não incomoda. E, mais do que isso, pude perceber algumas coisas que passaram batido no primeiro filme e agora, tenho uma visão “diferente” sobre a história.

A começar por um simples detalhe, que muda muitas coisas: a tensão sexual entre Stanley e Blanche é muito mais forte e  nesse filme, Blanche retribui os olhares. Em certo momento do filme, por exemplo, Blanche e Stella voltam de um show. Stella vai tomar banho e Blache tira a roupa e com uma “camisola”, passeia em frente a cortina, se exibindo para os homens que jogam cartas na mesa da sala. Staley sai da mesa, vai até Blanche e fica a encarando (com um olhar de desejo mesmo) e Blache corresponde! E essa tensão dura por muito tempo, até que Stanley cai em sí e volta para sala. Ok, eu posso ter sido a única, mas até então, eu achava que a Blanche não tinha esse interesse sexual por Stanley. 

Na segunda versão, eles ficam molhados de suor o tempo inteiro. Digo, todos os personagens sempre  aparecem com as roupas suadas e aquele cenário, fica parecendo mais sujo, deixando a situação mais tensa. Quero dizer, a sensação de calor, reforça o desconforto. Diane Lane está incrivelmente doce e com ela,  eu não consegui ver o lado “mulher de malandro” que Kim Hunter dá a Stella – afinal, ela apanha, sofre com Stanley, mas sempre volta pra ele.