Um bonde chamado desejo – 1995

Desde que vi “Uma Rua chamada pecado” fiquei marcada pela história. Desliguei o DVD com uma série de pensamentos rondando a minha cabeça e com uma vontade enorme de assistir a peça. Na época, não sabia quem era Tennessee Williams e pouco gostava da Vivien Leigh (por uma bobeira: a relacionava com a imagem da Scarlett O’Hara e ficava antipatizada, porque não me agradava o personagem).

Também nunca tinha assistido a um filme sequer com o Marlon Brando e não fazia ideia sobre aquele lado magnético dele. Agradeço ao homem da loja que, no dia em que comprei o DVD me disse: “Não se pode dizer que gosta de cinema, sem ter assistido uma produção como essa”. Eu realmente não poderia deixar de vê-lo – aliás, foi com ele que aprendi que o cinema e o teatro possuem ligações fortíssimas. umbondechamadodesejo_09Existem algumas produções que falam por entrelinhas, que contam histórias escondidas atrás dos pequenos detalhes. “Uma rua chamada pecado” (e aqui, me refiro a versão de 1951) é exatamente uma delas, que teve diversas cenas e diálogos cortados – como aquela excepcional do clímax, onde Stanley estupra a cunhada.  A mudança do título é por sinal muito interessante, já que “Um bonde chamado desejo” guarda diversos sentidos. E, convenhamos: Desejo e Pecado são duas coisas bem diferentes, ainda que relacionadas.

Não poderia entrar no méritone_93409 de análise porque sei que existem diversos textos na rede que são muito mais informativos e completos. Mas é que, finalmente, assisti a versão de 1995, estrelada por Jessica Lange, Allec Baldwin, Diane Lane e John Goodman e aquela mesma sensação que tive há alguns anos atrás, quando vi a versão de Elia Kazan, voltou.

Apesar do meu amor pela Jessica Lange, não existe nenhuma Blanche Dubois que se iguale a da Vivien (pelo menos pra mim, é claro). E digo isso, porque logo quando comecei a ver a segunda versão, fiquei impaciente ao ver Lange interpretando a Blanche. É realmente difícil se desvencilhar de uma imagem já construída e mais difícil ainda quando ela é bem feita. Lange aparece tímida, talvez até um pouco exagerada e aos poucos, vai pegando tom da personagem (do qual, já viveu nos palcos) até que nos consegue convencer e nos deixar tocar.

Eu digo isso porque também não queria deixar o meu braço torcer por Allec Baldwin e quando ele aparecia em tela o olhava com desdém, até que quando me dei conta, estava vidrada na tela, como se nunca tivesse ouvido falar daquela história. No fim das contas, eu acho que sempre vai ser um desafio fazer uma releitura de um clássico e não esbarrar em suas “perfeições” e a segunda versão  de Um bonde chamado desejo (que chegou a ganhar um Globo de Ouro, mas que posteriormente caiu no esquecimento, passa por esse caminho).

“Eu não quero realismo. Eu quero magia! Sim, sim, Magia!”
Vivien-Leigh-as-Blanche-DuBois-Vogue-15Aug13-VandA_b_1440x960Annex-Brando-Marlon-A-Streetcar-Named-Desire_03Sobre a segunda versão, gostei especialmente do ambiente, todo feito em cenário montado, interno. É visível a mudança das luzes, mas a artificialidade não incomoda. E, mais do que isso, pude perceber algumas coisas que passaram batido no primeiro filme e agora, tenho uma visão “diferente” sobre a história.

A começar por um simples detalhe, que muda muitas coisas: a tensão sexual entre Stanley e Blanche é muito mais forte e  nesse filme, Blanche retribui os olhares. Em certo momento do filme, por exemplo, Blanche e Stella voltam de um show. Stella vai tomar banho e Blache tira a roupa e com uma “camisola”, passeia em frente a cortina, se exibindo para os homens que jogam cartas na mesa da sala. Staley sai da mesa, vai até Blanche e fica a encarando (com um olhar de desejo mesmo) e Blache corresponde! E essa tensão dura por muito tempo, até que Stanley cai em sí e volta para sala. Ok, eu posso ter sido a única, mas até então, eu achava que a Blanche não tinha esse interesse sexual por Stanley. 

Na segunda versão, eles ficam molhados de suor o tempo inteiro. Digo, todos os personagens sempre  aparecem com as roupas suadas e aquele cenário, fica parecendo mais sujo, deixando a situação mais tensa. Quero dizer, a sensação de calor, reforça o desconforto. Diane Lane está incrivelmente doce e com ela,  eu não consegui ver o lado “mulher de malandro” que Kim Hunter dá a Stella – afinal, ela apanha, sofre com Stanley, mas sempre volta pra ele.

O Clube do Filme

David Gilmour é um crítico de cinema desempregado. Seu filho, Jesse, de apenas quinze anos, não vai bem na escola e recebe sucessivas reprovações.  Preocupado, David permite que Jesse largue a escola contanto que assista com ele – semanalmente – clássicos do cinema.  Juntos, pai e filho criam o “Clube do filme” e passam dias assistindo e comentando produções famosas como O Poderoso Chefão, A doce Vida, Uma Rua Chamada Pecado, Ladrões de Bicicletas, Tio Vânia Em Nova York (…). 

A história é sincera e envolvente, mais do que uma trama sobre pessoas que gostam de cinema, “O clube do filme” retrata a complexidade das relações humanas e familiares. Gilmour, que parece despretensioso, deixa bem claro que como pai, está sujeito a erros e acertos. Com essa convicção,  tenta fazer com que o filho perceba que amadurecer (seja amorosamente ou financeiramente) envolve um processo muito mais complicado do que ele imagina.

Imagem“Indicar filmes às pessoas é um negócio arriscado. De certa forma, é algo tão revelador quanto escrever uma carta para alguém. Mostra como você pensa, aquilo que o motiva, e algumas vezes pode mostrar como você acha que o mundo o enxerga. Então, quando você recomenda com entusiasmo um filme a um amigo, e diz: “Ah, é bom demais, você vai adorar”, é uma experiência desconcertante quando você o encontra no dia seguinte e ele diz: “Você achou aquilo engraçado?”
 

Um livro para cinéfilos?

Li “O Clube do filme” aos pouquinhos, marcando e voltando em passagens (ou em dicas) que me pareciam interessantes. Percebi que existe uma gama de clássicos que desconheço e que preciso assistir urgentemente. De fato, foi isso que me prendeu ao livro, Gilmour citava um filme e comentava sobre a impressão que teve dele. Mesmo com comentários superficiais, ele conseguia me deixar curiosa para saber mais.

Em algumas passagens, por exemplo, o autor diz que poucas pessoas prestam atenção na beleza do poema final do velho em “A noite do Iguana” (de John Huston). Que existiu uma época em que Woody Allen só filmava filmes maravilhosos, como Crimes e Pecados (de 1989). Que a Lolita de 1997 criada por Adrian Lyne é muito melhor do que a de 1962 criada por Stanley Kubrick. Que Marlon Brando quase foi escalado para o papel do padre em O Exorcista, que Quentin Tarantino passou mais de cinco anos tentando vender o seu primeiro roteiro (…)

Por isso mesmo, acho que, apesar da história principal se basear na relação entre pai e filho (e não ter sido explorada suficientemente, talvez por não ter tanto espaço naquele contexto), o livro é direcionado a pessoas que gostam de cinema ou que, pelo menos, conhecem nomes de atores e diretores. Outra coisa divertida da história é que David e Jesse categorizam os tipos de filmes como: “Prazeres Culpados” (filmes ruins, mas que a gente adora) ou ” Filmes Superestimados”.

P.S. Sobre a relação entre pai e filho, uns aspectos me incomodaram um pouco. David pareceu passivo demais, enquanto Jesse fazia burrada atrás de burrada, sem receber punições. “Pai, usei cocaína ontem”. “Tudo bem filho, se você o fizer de novo, não assistiremos mais filmes juntos”… (WTF?!)

Para quem participa do Filmow, existe uma lista com os filmes citados no livro, onde você pode marcar quais já assistiu e quais pretende assistir:

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