Ao som do mar e à luz do céu profundo

Ao som do Mar - nelson MottaDeixei este livro abandonado na prateleira por alguns anos, só porque uma colega havia comentado que não gostava da narrativa do Nelson Motta, “que era pesada e enrolada demais”. Fui na onda dela… simplesmente o abandonei. Até que um dia, uma outra colega que coordenava um projeto social pediu a doação de livros. Pensei: “Ok, vou doá-lo… mas antes, preciso ver se a narrativa é tão ruim quanto ela falou”. Li e amei, fiquei encantada – tanto pela narrativa, quanto pela história. Gosto é gosto.

“Ao som do mar e à luz do céu profundo” (aliás, este título s2!) é um convite à um mundo decadente e ao mesmo tempo glamouroso cujo cenário não poderia ser mais lindo: o Rio de Janeiro, anos dourados.

Repleto de erotismo e suspense, a trama centra-se em um grupo de amigos que moram no bairro Peixoto e são surpreendidos com a chegada do Coronel Francis W. Simon e de sua linda e envolvente filha Carol. Marina e Bombril logo ficam amigos da garota e são seduzidos por sua personalidade carismática e questionadora.

Bombril é um garoto negro, que ama jogar futebol. Marina, filha de Dona Eva (e bonita como a mãe), é uma moça bem comportada que não sabe se deve ou não se render à vida de libertação e festas que Carol vive. Marina vê a sua vida mudar completamente quando sua mãe resolve se desquitar do pai para viver com outro homem, o coronel Kleber. O problema, é o pai de Marina: um militar linha grossa, que não aceita perder.

nelson

das mãos suadas e dos olhares sorridentes…

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Eu sei que você está chateado, que saiu rápido sem dizer as palavras doces que eu tanto gosto de ouvir. O problema não é com você nem comigo, o problema somos nós dois, não dá certo. Eu disse que essa proximidade toda só traria mais dor, mas você insistiu na ideia de que faríamos bem um ao outro se deixássemos todo o desejo vir à tona. Deu no que deu. Não gosto de amores dramáticos, de encontros escondidos, de jogos de sedução. Quero um amor sincero, um amor de verdade, mais carne e mais alma. Quanto mais alma melhor. E coragem, C-O-R-A-G-E-M, pra perseguir o que é certo, pra viver sem pensar nos dias ou nas noites, ou nas músicas, ou nos filmes, ou nos outros, ah! os outros.  Nossos encontros foram perdendo a graça, o suor, o beijo o sexo a cama o vinho e foi se tornando essa coisa estranha, sem cor nem vontade. Aí o certo (existe certo em uma situação dessas?) O certo é cada um seguir seu caminho, arrumar outra pessoa, casar-ter-filhos. –Oi, tudo bem? –Nossa, é você? – Pois é, lembra-se daquela época em que saíamos juntos? – Claro! Como era bom… O quê tem feito da vida? –Comprei um carro novo, os gêmeos estão chegando… – Gêmeos? Parabéns! – E você, como está? – Arrumei um emprego, me mudo para o Rio de Janeiro na próxima segunda. –Que coincidência. – O quê? – Te encontrar, assim, logo agora… que você está partindo. – Pois é, estranho isso. – Ainda escuta os discos de Elis? – Todos os dias. – Lembro de você às vezes. – Eu nunca te esqueci. (o telefone toca). – Minha mulher, me desculpe. – Tudo bem, tenho que ir.  – Tchau. – Tchau, boa sorte! – Obrigada.

– despediram-se em um aperto de mãos.
a mão dele estava suada
ela se virou, sorriu com os olhos
nunca mais se viram.
 
 

O sequestro do ônibus 174, uma releitura sobre o choque do real

Em uma das reflexões iniciais de “O choque do real e a experiência urbana” Beatriz Jaguaribe afirma que a cidade (repleta de lixo, becos e fervilhantes atividades) é também cenário para a presença de novas tecnologias e meios de comunicação onde as pessoas são minadas por uma cultura do medo.

Diferente do que se imagina a “cultura do medo” não é experimentada empiricamente. Para a autora, a maioria dos cidadãos experimentam o medo (assaltos, roubos e violações) através da divulgação fílmica ou literária e todo o discurso e construção midiática influencia na criação de uma estética sobre a retratação da violência social.

onibus 174

Segundo Jaguaribe o choque do real pode ser entendido como a tentativa de provocar um efeito catártico no espectador ou leitor. Portanto a principal finalidade dessa estratégia é criar um incômodo, provocar espanto, atiçar a denuncia social e aguçar o sentimento crítico. Um aspecto importante é que o impacto não é necessariamente extraordinário, mas é exacerbado e intensificado. O real, por sua vez é como uma releitura ou uma representação do fato ao que Jaguaribe define: “o real é a existência de um mundo que independem de nós, a realidade social, em contraste, é uma fatia do real que foi culturalmente engendrada, processada e fabricada por uma variedade de discursos, perspectivas dialógicas e pontos de vista contraditórios”.

O conceito do choque do real e sua finalidade ajuda-nos a entender sua presença nos diversos meios de comunicação de massa (como a reportagem jornalística, o fotojornalismo e o cinema). As narrativas fílmicas (inclusive nos documentários) atendem ao que a autora chama de usar a verossimilhança e intensificação do real. Para ela, é comum observar a organização da narrativa para lhe dar mais fluxo e continuidade.

É importante ressaltar aqui uma observação realizada por Bill Nichols em referência aos documentários. Segundo Nichols o documentário se apoia muito menos na continuidade para dar credibilidade ao mundo a que se refere do que o filme de ficção. Percebe-se que muitas produções estão debruçadas sobre o que ele chama de montagem de evidência: “Em vez de organizar os cortes para dar a sensação de tempo e espaço únicos, unificados em que seguimos as ações dos personagens principais, a montagem de evidencia organiza-os dentro da cena de modo que se dê a impressão de um argumento único, convincente e sustentado por uma lógica”

Ônibus 174:

O sequestro ao ônibus 174 ocorreu em 12 de Junho de 2000 no bairro Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Sandro do Nascimento (então com 22 anos) invadiu o ônibus com um revolver calibre 38 com o objetivo de assaltar os passageiros. Impedido pela polícia militar, Sandro inicia um sequestro que duraria cinco horas. Toda a ação foi acompanhada e amplamente divulgada pela mídia. Dois anos depois, o episódio que marcou o povo brasileiro, foi tema para o documentário dirigido por José Padilha e Felipe Lacerda.

ônibus 174O documentário se propõe a recontar o caso através de entrevistas com os passageiros, com a polícia e com a imprensa. A produção também busca oferecer uma explicação para o episódio através de um estudo biográfico de Sandro (nele, por exemplo, temos conhecimento de que Sandro é um sobrevivente do Massacre da Candelária, que sua mãe foi assassinada quando ele ainda era muito pequeno e que sua condição marginalizada o levou a inúmeras prisões).

Sandro nasceu em 1978 e foi criado pela mãe até os seis anos (quando ela, grávida, foi assassinada na sua frente). Adotou o apelido de ‘Mancha’ e passou a ser morador de rua (viciou-se em drogas, nunca aprendeu a ler ou escrever e Sequestro onibus 174teve inúmeras passagens em instituições de jovens delinquentes).  Seus únicos contatos familiares (com forte alusão a figura materna) foram: sua tia Julieta, a assistente social Yvone Bezerra e a mãe Dona Elza da Silva. O sequestro ao ônibus 174 ocorreu em Junho. Sandro fez 11 pessoas de reféns. Após o sequestro (que resultou na morte da estudante Geisa), Sandro foi imobilizado pela Polícia e morreu asfixiado na viatura.

Há muitos aspectos que chamam atenção sobre o caso do ônibus 174 e Jaguaribe sabiamente destaca um deles: “o revelador e o inusitado do sequestro ao ônibus não é a trajetória terrível de Sandro. Não é a morte absurda da jovem Geisa, nem a espantosa incompetência da polícia e das autoridades, nem mesmo a condição execrável das prisões no Brasil. O que marca singularmente o episódio é a sua completa visibilidade midiática que fez com que esses terríveis ingredientes ganhassem projeção diante as câmeras”.

O documentário e o filme sobre o caso 174 adéquam-se ao que a autora chama de tradição do naturalismo e brutalismo, afinal, contam a história do “realismo sujo das ruas”, retratam a violência em situações limites e ilustram a precariedade e marginalização das classes mais baixas. É interessante observar que a mídia visual possui mais força do que a escrita – comprovado no que presenciamos com o sequestro: o espetáculo, a abundância de informações e uma incansável repetição. O que nos leva a questionar a função da mídia nesses acontecimentos… Apesar de romper com a causalidade e oferecer uma experiência intensa ao espectador (principalmente através da tragédia) o choque é silenciado pela banalidade.

Para a autora, a atitude blasé se justifica pelo medo. As pessoas, embora atentas ao entretenimento, temem que esse choque seja transferido para sua particularidade.  Todo esse cenário funciona como um efeito cíclico, o espectador tem medo, mas procura tais emoções para revitalizar seu cotidiano entediante, a mídia por outro lado, cria o imaginário do risco e depende da circulação da narrativa sobre a violência. Ou seja, o contado do espectador com a metrópole, resume-se em voyeurismo.

onibus-174“O boom de biografias, livros de reportagem, documentários, filmes e narrativas realistas não é uma novidade para o público brasileiro, mas o que marca a produção recente é o forte apelo ao retrato da realidade em fase da violência urbana.”

A atitude blasé é muito bem ilustrada através do documentário sobre o ônibus 174 na entrevista com o sociólogo Luís Eduardo Soares:

“Esse Sandro é um exemplo dos meninos invisíveis que eventualmente emergem e tomam a cena e nos confrontam com a sua violência que é um grito desesperado e impotente. A nossa incapacidade de lhe dar com nossos dramas: com a exclusão social, com o racismo. Nos aprendemos a viver tranquilamente com os Sandros, com as tragédias e com os filhos das tragédias. Isso se converteu em parte do nosso cotidiano. A grande luta desses meninos é contra a invisibilidade. Nos não somos ninguém e nada se alguém não nos olha e nos reconhece, nos dá valor, não preza nossa existência, não devolve a nos a nossa imagem ungida de algum brilho, de alguma vitalidade ou reconhecimento. Esses meninos (de rua) estão famintos de existência social. Um menino negro, pobre, transita invisível pelas ruas brasileiras. Há duas maneiras de se produzir invisibilidade: esse menino é invisível porque nós não o vemos, nos negligenciamos a sua presença. Ou porque projetamos sobre ele um estigma, uma caricatura, um preconceito  .”

Para Beatriz Jaguaribe é importante observar que apesar dessa falta de atitude dos espectadores e cidadãos não há uma divisória rígida nem uma cultura do apartheid. Distintas realidades entram em conflito na metrópole, são confrontos acirradamente desiguais, violentamente injustas, altamente discriminatórias quanto ao gênero, raça e cor. Há uma troca, uma hibridação contínua de símbolos e culturas.

As esganadas

e a relva, Fernando Botero
Mulher nua sobre a relva, Fernando Botero
Dentro de cada mulher gorda
há uma mulher magra suplicando para sair.
 Fora de cada mulher gorda
Há uma mulher mais gorda ainda
Suplicando para entrar.
(Jô Soares)

 

Passeando pela Leitura ontem, encontrei o livro “As esganadas” do Jô Soares em preço promocional e não resisti. Levei para casa e li, em menos de um dia. Hoje de manhã, conversando com uma amiga da faculdade, dizia que se eu fosse uma escritora, era exatamente esse tipo de narrativa que gostaria de construir. Jô Soares consegue ser simples direto e divertido. Ele ainda mistura personagens reais e fictícios em um cenário riquíssimo (com um gostinho delicioso de nostalgia e saudosismo.)

‘As esganadas” é uma obra escrita em terceira pessoa, que se passa no Rio de Janeiro na década de 30, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas. A trama concentra-se no caso das esganadas, mulheres jovens, bonitas que são brutalmente assassinadas. Todas tem algo em comum: são gordas. Outra coisa: todas elas morreram esganadas com comidas e seus corpos são encontrados sem os olhos. O perigoso assassino usa como isca, requintes da culinária portuguesa, irresistíveis aos olhos (e aos estômagos) das jovens senhoras.

Logo no início, o autor nos revela quem é o assassino. Trata-se de Caronte (nome que tem referência ao barqueiro do Auto da Barca do Inferno, cuja função é atravessar as almas dos mortos). Caronte é um homem alto, pálido e muito magro. Ele herdou dos pais a funerária mais famosa da América do Sul, a Esfinge. Sua mãe, Odília Barroso era uma mulher enorme (com quase cento e quarenta quilos) e tinha muito medo de ver o filho engordar. Por isso o obrigava a seguir uma dieta restrita de qualquer tipo de doces ou pratos gordurosos, sem levar em consideração que o filho tinha puxado o metabolismo do pai (e poderia comer de tudo, sem preocupar-se em engordar). Em seu aniversário de dez anos, a mãe, em vez de bolo, pôs na sua frente um prato com meio mamão enfeitado com velas. Num ataque de fúria e ódio, Caronte mata Odília.

Caronte mata inúmeras mulheres brutalmente, mas há dois assassinatos que me chamam a atenção. O primeiro é o da freira Irmã Maria Auxiliadora.  Disfarçado de frade, Caronte disse a irmã que estava disposto a ouvir suas confissões. Ela lhe diz que precisava confessar todos os dias porque sempre comete o mesmo pecado: o da gula. Ele então sai do confessionário e afirma que recebeu de um emissário do Vaticano uma informação do papa: de que a gula deixará de ser um pecado. Em sua felicidade e inocência, a Irmã acredita no falso frade e aceita sua penitência: “a irmã deve ingerir a causa das suas faltas até não poder mais, como se devorasse o mal que lhe consome as entranhas”. Ajoelhada, a freira começa a comer a toda velocidade os pasteis de Santa Clara que o assassino lhe trouxe. Enquanto isso, Caronte fala um falso (e engraçado) latim como estivesse a exorcizando “Exitus Gula Demoninum!” A irmã comendo em um ritimo frenético começa a  tossir, mas não para de comer. Caronte então, pega um punhado de pasteis e lhe enfia goela abaixo. A freira morre esganada.

Outro assassinato que adorei foi o da Greta Sübeschlitz, afilhada do almirante Wilhelm Canaris, chefe da Abwehr. A gorda alemã pertencia a uma rede de espiões que a Abwehr pretendia montar no Brasil. Foi atraída pelo furgão de Caronte que trazia nas prateleiras amostras de salsichas recheadas, morreu engasgada com as próprias tripas. Seu corpo foi encontrado no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, justamente no dia em que encenavam uma peça de Wagner em homenagem ao embaixador alemão Karl Ritter. O corpo nu de Greta foi enrolado nas cortinas do teatro, seu cadáver sem olhos balançava na extremidade da corda, enquanto seus cabelos estavam enrolados em salsichas.

A trama também conta com quatro personagens que se envolvem para resolver o caso. Tobias Esteves era um detetive em Portugal mas foi afastado do cargo depois que envolveu-se (com a ajuda de Fernando Pessoa) em um falso suicídio. O jovem (baixo e roliço) veio para o Rio de Janeiro para abrir uma franquia de doces e faz grande sucesso. Porém sua paixão sempre foi desvendar crimes. Sabendo do caso das esganadas, ele resolve se oferecer para ajudar o delegado Mello Noronha. O delegado, por sua vez, aceita a oferta e junto ao seu outro ajudante, Valdir Calixto (um homem atrapalhado e muito, muito engraçado) saem às ruas para resolver o caso. No meio da trama, surge Diana, a jornalista da revista O Cruzeiro, que não larga a sua câmera Leica

Bom, depois de ver o tamanho desse texto, dá pra perceber o quanto fiquei entusiasmada com o livro. Vá por mim, é muito divertido e descompromissado. Permitam-me reproduzir uma passagem que eu mais gosto:

Capa-de-As-Esganadas-do-Jo-Soares-vertical-original-200x300“Existe um preconceito velado contra a obesidade. Na verdade, dificilmente os homens o sentem. Podem ser gordos inteligentes ou ricos ou oferecem tantos outros atrativos. Quem sofre o problema com maior intensidade são as mulheres. As mulheres gordas. O leitor pode se escandalizar com o uso da palavra gorda. Os eufemismos mais comuns são: cheinha, forte, grande e, o mais usado, gordinha. Geralmente acham que a gorda (odeio a palavra obesa) não tem força de vontade. Nem caráter. Nem vergonha na cara. A gorda é um pária, o excesso do peso, um divisor de águas. O próprio adjetivo é um palavrão. Ninguém se importa com o sofrimento ou com a humilhação da gorda. Acham que ela é gorda porque quer. Observem o olhar triste das moças gordas varrendo as vitrines da moda. Os figurinos são para as magras. Alguns vendedores ainda informam sem se alterar:” Aqui é só pra pessoas normais, madame”. E a gorda se afasta engolindo o ultraje. Restam-lhe as lojas especializadas ou as costureiras do bairro. Para mim, anormal é o tratamento do vendedor. A obesidade é democrática, não faz diferença de classe. Há gordas ricas e gordas pobres. Todas sentem a mesma reprovação silenciosa da sociedade. Existem gordas belas, mas, se a beleza é notada, há sempre um apêndice ao comentário: o rosto é lindo, pena que seja gorda.”

Viva Elis

Com a correria do novo emprego e com as vésperas de provas na faculdade, acabei sumindo do La Amora. Não foi de propósito, eu juro. Acho até que isso vai acontecer outras vezes porque o meu cotidiano anda me consumindo muito: graças a Deus.  Mas hoje, entre uma matéria e outra feita para a TV, tentei conseguir um tempo para escrever sobre a experiência maravilhosa que tive. Deixei minha chefe acreditar que estava fazendo uma matéria só pra falar sobre a exposição que chegou hoje a Belo Horizonte, no Palácio das Artes da minha cantora favorita: Elis Regina.

O projeto Viva Elis, promovido pela Nívea já não é uma novidade para os fãs da cantora.  Mas eu confesso que eu não me agüentava mais de vontade de ver as imagens, os vídeos e os áudios que trazem uma retrospectiva da carreira dela. Fiquei sabendo que a exposição vinha para Belo Horizonte em Abril e desde aí, não consigo me segurar de tanta vontade.

A mostra passou por várias cidades, dentre elas: São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Fico feliz que tenha chegado até aqui. BH nunca foi um pólo cultural (já perdemos boas peças por isso). Em São Paulo, a exposição recebeu cerca de 200 mil visitas e acho que Belo Horizonte não vai ficar atrás. O engraçado foi que ontem à noite, eu pensava: eu quero ser a primeira a entrar na exposição. Uma pena, não deu… fui a décima.

Acontece que hoje eu respirei Elis e nada vai me tirar do sério até o final do dia (nem mesmo saber que minha pauta caiu). Quando eu sai da faculdade, as pressas para chegar no centro de BH e ver a exposição, me deparei com uma foto da Elis na capa do Jornal O Tempo, já é meu costume comprar, mas hoje comprei com ainda mais gosto.

No texto, o jornalista Daniel Toledo que assina pela matéria comenta uma passagem no mínimo interessante: “Foi sentada como um índio – e não com as pernas elegantemente cruzadas – que a cantora Elis Regina concedeu uma entrevista na televisão, ao vivo. Por conta desse detalhe, alguns espectadores da emissora que transmitia a atração ligaram à produção do programa, pedindo que a cantora se portasse de modo menos agressivo. Com a presença de espírito que lhe era costumeira, Elis aproveitou a deixa para falar sobre os modos de índios, hindus, budistas e cristãos, reivindicando antes de qualquer outra coisa, o direito de se sentar como queria.”

Pronto, já não precisa dizer mais nada. Gosto da Elis Regina desde que me entendo por gente e se tem um motivo pra isso são esses três aspectos: a voz, as musicas que escolhia e a personalidade. Estava lembrando hoje de quando a professora de artes pediu para que os alunos interpretassem seus ídolos. Lembro-me que três meninas se vestiram de Ana Maria Braga (acho que era estouro na época). Eu: cantei Arrastão.

Eu cheguei esbaforida na exposição, porque (talvez pela ansiedade) acabei descendo no ponto errado. – acontece. E na medida em que eu ia entrando, me emocionava ainda mais. Vi fotos de Elis pequena, de Elis aos quinze, vinte anos. Fiquei sentada, vendo aquele vídeo maravilhoso em que ela canta “Cinema Olympia” de Caetano e me deslumbrei  com as réplicas das roupas que ela usou no show Transversal.

Sabe, eu fiquei não surpresa, mas extasiada. E eu estava tão satisfeita de encontrar outras pessoas, que assim como eu, adoram Elis e gostam da música, do trabalho dela. E de saber que ela desperta curiosidade nas pessoas: alguns ali nem sabiam quem eram Elis e foram para ouvi-la, para conhecê-la.

O mais engraçado é que quando eu fui almoçar fiquei pensando: como seria se Elis Regina estivesse viva. O que ela acharia das redes sociais, de Lady Gaga. O que ela diria sobre os Biossenssores, sobre a primeira mulher a ser presidente, sobre o casamento gay ou sobre o Obama e coisa e tal. E fiquei me perguntando o que seria Elis viva, o que fariam com ela (e dela). Será que ela se tornaria um Milton ou uma Maria Bethânia, endeusados pela mídia mas em linhas completamente alternativas. Uma velha linda e louca como a Rita Lee ou uma piada pronta como a Vanusa (eu adoro a Vanusa, mas tem hora que ela vira piada pronta, não tem jeito).

Então, de fato: a morte de Elis contribuiu para a construção do mito. Assim com Cássia Eller ou John Lennon (claro, que cada um com suas próprias dimensões). – Não há nada de novo no que eu estou falando não é? Sei lá, só que eu penso muito nisso sabe. Será que uma hora ela iria desandar como aconteceu com Wilson Simonal? Que morreu completamente no limbo? – Bom… na história não se cabe suposições:  Foi ou não foi. E no caso da Élice (como era carinhosamente chamada), foi assim e pronto.

Caramba, olha só o que virou esse post!. Me desculpem, acho que estou cansada e por isso só estou escrevendo asneiras. Bom… pelo menos, confiram as fotos: